11/09/2019

Café com livros 






Decorreu no dia 11 de maio de 2019, em Leiria, no auditório do m|i|mo - museu da imagem em movimento, mais uma edição de “Café com livros”. A convidada foi  a professora Helena Pato,  um dos rostos femininos da resistência à PIDE,  que contou na primeira pessoa o que foi  viver o tempo da clandestinidade, da tortura e da prisão. O seu livro A Noite Mais Longa de Todas as Noites é um testemunho da resistência ao Estado Novo e da luta pela Democracia em Portugal.


      
       Helena Pato nasceu em Mamarrosa, Aveiro, em 1939.
Licenciada em Matemáticas, dedicou a sua vida profissional ao ensino e à formação de docentes, tendo mesmo publicado livros, trabalhos e estudos, no âmbito da Pedagogia e da Didática da Matemática. Coordenou Suplementos de Ciência e de Educação em jornais diários. 
Foi dirigente da Associação da Faculdade de Ciências de Lisboa, e dirigente política da CDE, de 1969 a 1973. Em finais da década de 60, foi uma das fundadoras do Movimento Democrático de Mulheres. 
 


 No início da década de 70, fez parte do núcleo de professores que criou e dirigiu os Grupos de Estudo do Pessoal Docente e fundou os primeiros sindicatos de professores nascidos em 1984. Pertenceu às primeiras direções do Sindicato dos Professores da Grande Lisboa.
Durante duas décadas militou ativamente na Resistência ao regime fascista. Esteve no exílio durante três anos, foi presa e detida várias vezes pela polícia política.


Helena Pato viveu, sofreu, lutou por ideais quando era proibido ter ideais; falava bem alto, quando era preciso calar; calava quando a queriam obrigar a falar… Tudo isto teve um preço, que ela nunca se recusou a pagar… O seu livro «A Noite Mais Longa de Todas as Noites» é um registo impressionante que nos remonta não só à “noite longa”, mas também aos dias longos de um Portugal cinzento e pobre.  



 A escritora Maria Teresa Horta escreveu no prefácio deste livro as sábias palavras que se transcrevem:
  Uma escrita luminosa

           A noite Mais Longa de Todas As Noites é um livro que deve ser lido, degustado com cuidados de saber, a tomarmos o gosto á escrita luminosa de Helena Pato, que página após página nos vai contando-mostrando o longo e corajoso caminho da resistência portuguesa, de que fez parte activa, contra a ditadura fascista. Luta de tantos e tantos anos, que acabaria por nos levar até ao 25 de Abril…
 à liberdade.
        Obra de uma precisão exemplar e simultaneamente de uma beleza límpida no seu veio narrativo, tessitura de recordações assumidamente pessoais embora arreigadamente políticas, já que Helena Pato nelas se debruçou para narra-las, quer através da sua própria experiencia, quer da memória colectiva das últimas décadas do fascismo em Portugal. 
         A noite Mais Longa de Todas As Noites é pois uma obra tecida com o fio do júbilo dos ideais, mas igualmente com os acontecimentos vividos no nosso país. Então asfixiado por uma longa, cruel e impiedosa ditadura. Sendo tudo isto elaborado com uma vivacidade e uma argúcia que nos leva a lê-la até chegar ao fim, para logo desejar tornar ao seu começo.
        E foi assim que fui seguindo, uma após outra, estas memórias políticas, como a certa altura a sua autora sublinha.
          Luta após luta, após luta,
         coragem após coragem, após coragem, sem que Helena Pato alguma vez se auto-elogie ou de alguma maneira se enalteça; sempre inteligente e frontal por vezes utilizando mesmo um discurso que pode aqui e ali perpassar pela auto-ironia, assim como por um espontâneo e genuíno entusiasmo.
        Quanto a mim, aliás, esta é uma das facetas mais fascinantes, mais belas e até mesmo comoventes de A noite Mais Longa de Todas As Noites. Pois Helena Pato ao relatar a sua total entrega à Resistência fá-lo com uma intensidade tranquila, uma quase “alegria serena” e jamais enquanto heroísmo, cerração ou sacrifício.
         Desta viagem ao passado, sobressai o olhar frontal, tal como o envolvente e revolvido prazer num entrançar-desentrançar de emoções, numa tessitura de memórias de prisão, de tortura, de censura que, hoje, continuam a atormentar-nos, a “apunhalar-nos”, fazendo-nos gelar o sangue. Tempos de negrume, até onde a escrita de Helena Pato nos leva, coração apertado,
         a reconhecermos aquela difusa mas persistente rosa do sonho, que jamais  - mesmo durante o período do terror mais negro – deixou de bater do lado esquerdo do nosso peito em sobressalto.
           Apesar do medo e da revolta, da escuridade e do desespero, de tal forma que por vezes, de madrugada, ainda hoje nos assola a angústia: olhos de súbito abertos no escuro, como quem espera a “visita” da Pide, que às seis da manhã, tinha por hábito bater-nos à porta, a entrar-nos casa dentro, para revolver em seguida na devassa, durante horas.
         E a escrita solar de Helena Pato é exímia em mostrar-nos, tantos anos depois, marcas ferozes tal como as feridas que ainda supuram, a deixar-nos cicatrizes na alma.
         Coerente, lúcida e corajosa, A noite Mais Longa de Todas As Noites é uma obra empolgante na sua serena frontalidade. Recordações onde não se iludem os medos nem as dúvidas, dando-nos a ver, paralelamente, a coerência, o entusiasmo e a entrega, sempre com a esperança murmurando ao nosso ouvido,
           a fazer-nos entender com naturalidade o arrojo, a coragem e a dádiva pessoal, enquanto componentes inseparáveis e naturais da luta por um ideal maior.
            Pois maior que tudo o resto, irá ser sempre e para sempre: 
             a entrega ao sonho,
                                                 a sede de liberdade.


Maria Teresa Horta 
           Lisboa, 15 de Abril de 2018

Foi com simpatia e tranquilidade serenas que Helena Pato falou do seu passado de Resistente. Quem esteve presente ouviu falar da cumplicidade entre os Resistentes; dos ideais comuns; dos limites da loucura; dos estratagemas de luta; das angústias familiares, dos algozes… 

 

Helena Pato, professora, é toda ela uma aula da história recente. Foi um privilégio tê-la entre nós, ouvi-la foi um crescendo de interesse e admiração por toda uma geração que lutou por um país democrático e livre.
      E com a tradicional foto, para memória futura, terminou mais um "Café com livros". Esperamos por vós na próxima tertúlia. Até lá não recusem

um café quente

                             um livro fresco

                                                            uma ideia nova    
  



Texto de Rosa Neves
Fotos de Joaquim Cordeiro Pereira
Edição de Augusto Mota