Não uso palavras. Uso acções. Sou um poeta da acção. Convenciono poesia nos meus gestos e directrizes. Por isso todos me vêem e concebem como um homem rude e mau, tenho a perfeita consciência disto. Nada de mais errado. Note! Olhe bem para mim, neste momento. Estando aqui sentado à sua frente a compartilhar consigo este maravilhoso charuto, pareço-lhe um homem malévolo? Responda-me com sinceridade.
-Não.
- Como vê - solta uma nova gargalhada - apenas me situo à frente do tempo. Como todos aqueles, aliás, que de alguma forma, marcaram e alteraram o rumo e o ritmo da história. Além disso, todos aqueles que trabalham comigo, de mais perto, sabem que não gosto de dividir, os gestos ou acções, em bons ou maus gestos, em boas ou más acções. Para mim não existem dualidades nem questões dúbias: existem regras, existem leis e circunstâncias. Mas são apenas - quanto a mim -as circunstâncias que definem a verdade, a moral, a justiça, a vida, a morte. O mais importante para mim é a obediência e a noção do novo: o espanto. Como sabe todos os poetas são seres malditos, visionários e, portanto, incompreensíveis para a maioria. Porque observam o que mais ninguém vê. Vêem mais longe. Poetas como eu e você...
Mas se quer seguir um conselho, não deveria guardar só para si os seus escritos. Não leve a mal esta minha consideração. Mas incomoda-me a cobardia. Os pusilânimes. Mas sei, não ser este o seu caso. Não o é decerto.
No seu caso concreto, parece-me evidente ter chegado o seu momento. É chegada a sua hora. A hora do grande salto. A hora H.
Ergueu-se da cadeira e dirigiu-se ao outro. Circundando-o, ofereceu-lhe o cinzeiro para que também ele apagasse o charuto. Colocou, com intensa ternura, as suas mãos sobre os seus ombros, e, devagar, subiu-as até ao pescoço, principiando, sub-repticiamente a apertá-lo ,a apertá-lo, cada vez com mais força.
-Eis a minha grande obra - concluiu.
Texto de Sandro William Junqueiro.
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