A responsável pelo Grupo “Trêstúlias”, Rosa Neves, abriu mais uma conversa
tertuliana dando as boas-vindas a todos os presentes que fizeram parte da 25ª
edição de “Café com livros”.
Deixou também um agradecimento à CML, na
pessoa do Senhor Vereador da Cultura Dr. Gonçalo Lopes, pelo apoio logístico dado a este
projeto. O agradecimento foi extensivo à equipa do m|i|mo, liderada pela Dra. Sofia
Carreira, pelo profissionalismo com que sempre recebe "Café com livros". Tudo o resto decorre
da vontade e da participação fantásticas de um já grande grupo de amigos que há cinco anos se junta à volta de conversas comuns.
Rosa Neves referiu que a transversalidade do saber e conhecimento do Amigo
e Colega de profissão Augusto Mota é enorme e por isso difícil de sintetizar.
Apresentou-o como uma pessoa ilustre, mas discreta, como costumam ser os
construtores de ideais. E continuou referindo que ele é um pensador, artista,
mestre, amigo. Uma cabeça enredada na criação constante, que o faz respirar.
Com um percurso riquíssimo de produção artística, Augusto Mota faz parte de uma
geração que marcou a cultura da sua época com o traço da irreverência e do
futuro. Tem uma vasta, valiosa e multifacetada obra que vai desde a pintura, o
mosaico, a gravura, a publicidade, a ilustração, o cinema, a fotografia e a
escrita.
É figura indissociável da vida artística, interventiva e humanista da
cidade e do país, tendo mesmo os seus trabalhos sido referidos na Alemanha, aquando de uma exposição que fez no Ibero-Club de Bonn, em 1962.
Augusto Mota, não deixa de nos surpreender e por isso veio partilhar com os
tertulianos a sua faceta de observador atento que esconde o olhar atrás da
máquina fotográfica e capta as pequenas coisas do dia-a-dia e, no caso
concreto, materializou-as na exposição “Olhares”, cuja curadora responsável foi
a própria Rosa Neves.
Augusto Mota, tomando a palavra, fez uma breve introdução ao valor da imagem como meio de comunicação na história da cultura ocidental, referindo dois exemplos:
1. a célebre Coluna de Trajano, em Roma (séc.I d.C.), que exalta os feitos do general Trajano, na Dácia, no seu friso espiralado de carácter
histórico-narrativo, ao longo dos 30 metros de altura da coluna, friso que contem
cerca de 2500 figuras repartidas por 115 cenas, com uma riqueza de pormenores que possibilitam uma
valiosa compreensão da organização militar romana;
2. um outro exemplo marcante é a Tapeçaria de Bayeux (séc. XI), que ao longo dos seus 70 metros de comprimento e 50 cm de altura narra em 58 cenas, mas já com texto incorporado nas imagens, cenas da conquista de Inglaterra por Guilherme da Normandia.
Nesta breve incursão pela história da figuração
narrativa não podia ter faltado uma chamada de atenção para o
poeta inglês William Blake (1757 - 1827), sobretudo para a sua obra de
gravador, impressor e pintor que, retomando a tradição conventual das
iluminuras nos livros sagrados, inicia uma técnica muito sua para ilustrar os
seus próprios livros: grava em chapas de cobre os seus textos e respectivas
ilustrações, imprime-as para, depois, colorir todas as páginas à mão.
Quatro poemas de "Songs of Innocence and of Experience"
Esta técnica artesanal só lhe permitiu edições muito
limitadas das suas próprias obras, variando as cores de uma mesma obra de
edição para edição. Mas o que sobressai neste autor é o dramatismo da
interpenetração texto/imagem que antecipa a poesia ilustrada que virá a
conhecer entre nós, nos anos 50 e 60 do século passado, uma vaga de fundo,
tanto em exposições, como na edição de postais, sobretudo por razões mais
político-sociais do que estéticas.
"Europe, a prophecy", K.41 (9)
Postal editado pelo British Museum
Hoje com as facilidades da fotografia digital e dos programas informáticos que permitem uma fácil junção do texto à imagem acabámos por chegar a um novo conceito: o fotopoema, que nos permite divulgar a poesia com muito mais facilidade e de um modo mais apelativo, alcançando um público muitíssimo mais vasto do que a poesia ilustrada, tanto através da net, como em exposições.
Exposição de Poesia Ilustrada na Marinha Grande
Postais:
Poema de José Dias
Desenho de Fernando Felgueiras
Poema de Ovídio Martins
Desenho de Pedro Frazão
Edição do III Encontro dos Suplementos e Páginas Literárias da Imprensa Regional
Rosa Neves passou a palavra ao Senhor Vereador da Cultura, Dr. Gonçalo
Lopes, que evidenciou o sucesso do projecto “Café com livros” e lhe reafirmou o
seu apoio e confiança. Salientou todo o mérito do convidado Prof. Augusto Mota,
de quem, aliás, disse orgulhar-se de ter sido seu aluno.
De seguida foi inaugurada a exposição “Olhares” , composta por 30
FOTOPOEMAS, com fotos da autoria de Augusto Mota e poemas de autores por si
seleccionados: António Simões, Eugénio de Andrade, Carlos Alberto Silva, Cristina Nobre,
Cruzeiro Seixas, Fernanda Sal, Gabriela Rocha Martins, Luís Pignatelli, Maria
Encarnação Baptista, Maria Gomes, Maria Toscano, Rosa Mar e Rui Mendes.
Durante a visita o autor foi informando quais os poemas que seleccionara de obras publicadas e quais os que os poetas criaram motivados pelas fotografias que previamente lhes enviara. Tal método de criação, designado por écfrase (do grego 'ekphrasis') é uma prática de 'criação/descrição literária' que remonta aos textos clássicos, mas que tem evoluído ao longo dos tempos. O Romantismo deu novo fôlego à poesia ecfrástica, sendo a "Ode sobre uma urna grega", do poeta inglês John Keats (1795-1821), sempre referida como um bom exemplo de tal método de criação literária.
Goya - "Os fuzilamentos de 3 de Maio de 1808"
Entre nós, o poema "Carta aos meus filhos sobre os fuzilamentos de Goya", de Jorge de Sena (1919-1978), é um bom e moderno exemplo de 'écfrase', porque o autor não cai numa prática discursiva linear do quadro, antes nos consegue transmitir todo o horror que ressalta da pintura de Goya, mas projectando-o dramaticamente para um futuro... Ouvir o poema: https://www.youtube.com/watch?v=ggoc8v0dgD0
A visita à exposição foi muito apreciada, decorrendo em amena tertúlia
volante, com todos os presentes a solicitarem explicações e considerações ao
convidado, que a todos procurou dar atenção.
Por entre imagens e poemas, por entre os corredores do espaço luminoso e
elegante do m|i|mo voltou-se ao auditório, onde foi feita a 1ª Homenagem
pública à poeta leiriense Maria da Encarnação Baptista, autora de «Hora Entendida», livro editado pela Editora Inquérito, Lisboa, 1951, com um prefácio/ensaio de Adolfo Casais Monteiro. Mercília Francisco, Cristina Nobre e Cristina Barbosa leram expressivamente poemas desta obra.
A tertúlia terminou com uma surpresa feita ao nosso convidado: Bolo de
aniversário muito especial, bolachinhas saborosas, soquetes e … o habitual café com
Livros.
*
Augusto Mota realizou, no dia 1 de Março, uma visita guiada a pedido da
associação cultural leiriense SEMPRAUDAZ, com sede no Centro Cívico, à rua
Direita, visita que também foi precedida de uma breve introdução, no auditório
António Campos, sobre a importância da união texto/imagem. A tal visita guiada
se referem as fotografias seguintes:
Como dissemos inicialmente a exposição prolongar-se-á até ao último dia deste mês. Só então terminará, verdadeiramente, a tertúlia "Café com livros" do dia 27 de Janeiro, já que "Olhares" é uma sua extensão que tem permitido ao espectador um "diálogo silencioso" com as imagens e a sua interligação com os poemas.
Voltamos a encontrar-nos em data e local a
anunciar.
Até lá não
recusem
um
café quente
um livro fresco
uma
ideia nova
Texto de Rosa Neves
Fotos de Joaquim Cordeiro, Lídia Raquel, Nuno Verdasca, Pedro Carvalho e Rosa Neves
Sem comentários:
Enviar um comentário