VIVENDA LOPES
(A
história que vai ler é baseada em factos reais. Aconteceu. Mudei o apelido do
senhor, apenas. E então era uma vez:)
Era
uma vez um homem ainda novo que casou cedo com uma mulher pobre. Ela também era
nova. E ele também era pobre. Vamos ver todos o que lhes aconteceu.
Casaram-se
– e a vida não andava. Tinham pouco dinheiro. O futuro parecia-lhes, aos dois,
muito mais perigoso do que o passado. Não passavam fome, mas necessidades – ai
isso sim, passavam.
Vai
daí, ele lembrou-se de emigrar para a América.
Foi ter com a mulher e teve a
conversa do costume:
– Olha, eu vou ali e já venho.
E
ela respondeu-lhe assim:
– Ou então vou eu lá ter.
E
assim foi. E assim tudo foi. Ele embarcou, desembarcou e arranjou trabalho.
Passados uns cinco anos, o homem voltou ao país natal, que é o nosso Portugal,
e disse assim à mulher:
– Olha, eu vou ter de me casar na
América com uma velha. Mas tu ouve isto com atenção.
E
então ele explicou à mulher. Explicou-lhe muito bem explicadinho. E ela ouviu.
E ela escutou. E ela concordou. Ele ia casar-se com uma velha tão rica, que o
ouro, ao pé da velha, perdia valor. E ela aceitou. E ela concordou. Que sim
senhor.
Divorciaram-se
em Portugal. Ele levou a documentação para a América. Quando chegou à América,
a velha estava à espera dele. Ele mostrou-lhe os papéis. A velha ficou
contente. Passados uns tempos, casaram-se. E foram felizes enquanto esta
história não acaba.
O
homem português e a velha americana casaram-se perante a Lei e perante a
Igreja. Ele deixou de ser criado dela. Ela continuou a ser patroa dele. Veio um
dia em que ela se queixou da criada de quarto. Então, ele disse-lhe assim:
– Tenho uma prima em Portugal que é
muito séria e que dava uma criada porreira.
E
assim foi. Ele mandou vir a ex-mulher de Portugal. Explicou-lhe tudo muito bem
explicadinho. Ela disse que sim. Ele mandou-lhe dólares para o bilhete. Ela
entrou no avião, saiu do avião e tornou-se criada.
Vinte
e dois anos passaram até que a velha morresse. Os dois portugueses esperaram a
fio os vinte e dois anos. Quando a velha americana morreu, o viúvo continuava
português como um alho. Casou-se com a ex-mulher logo a seguir.
Voltaram
os dois, patrão e criada, para Portugal. À beira da estrada, entre Aljezur e
Santa Comba Dão, bem acima de Tavira e muito antes de Ribeira de Pena, a
vivenda do casal impressiona. Tem tijolo, tem tinta, tem telhado, tem casota de
cão e tem cão. E no relvado, cortado a tesoura de letras de sebe, pode ler-se:
– Vivenda Lopes.
Graças
a Deus.
Crónica de Daniel Abrunheiro, in quinzenário «Trevim», 27 de Outubro de 2016
Fotos obtidas na net
Edição de Augusto Mota