30/09/2006

Nas Comemorações do Dia Mundial da Arquitectura

" Metropolis", de Fritz Lang, 1927.

No dia 3 de Outubro comemora-se o Dia Mundial da Arquitectura e a Ordem dos Arquitectos preparou um vastíssimo leque de actividades que decorrerão ao longo do País e nas ilhas, durante todo esse mês.
Assim, no dia 2, segunda-feira, na Biblioteca Municipal de Faro, será projectado o filme que Fritz Lang realizou em 1927, "Metropolis". Acompanha a projecção, a leitura de excertos de Mário Cesariny, Gonçalo M. Tavares, Herberto Helder, António Ramos Rosa, Allen Ginsberg e Albert Sánchez Piñol, por Sandro William Junqueira.
Luís Conceição, ao piano, interpretará composições de Béla Bartók, Frédéric Chopin e Ludwig von Beethoven.

veja onde lemos

29/09/2006


Fotopoema 66. Augusto Mota.

A Dignidade das Mulheres ( Excerto )

Honrai as mulheres! Elas entrançam e tecem
rosas divinas na vida terrena,
entrançam do amor o venturoso laço
e, através do véu casto das Graças,
vigilantes, alimentam o fogo eterno
de sentimentos mais belos, com a mão sagrada.
(...)
Na mais modesta cabana materna
foram deixadas, com modos envergonhados,
as filhas fiéis da natureza piedosa.
(...)
Mas, com modos mais brandos e persuasivos,
as mulheres conduzem o ceptro dos costumes,
acalmam a discórdia que, raivosa, se inflama,
As forças hostis que se odeiam
ensinam a maneira de ser harmoniosa,
e reúnem o que no eterno se derrama.
Friedrich Schiller.
Trad. de Maria do Sameiro Barroso.

26/09/2006

Legenda Íntima 122. Augusto Mota

11. Tem de ser

Tem de ser um raio de extrema claridade,
onde a densíssima luz da manhã se concentre,
um fio de gelo longo, translúcido, leve como o vento,
espetado neste pão de ternura prometida
ainda quente do forno da infância,
que é o teu sempre menino,
envelhecido coração,
unindo o infinito às secretas câmaras da terra
onde a memória se acomoda;
tem de ser um raio dessa luz que se embebeda
do olhar intenso das crianças
eaquece as frias manhãs da nossa perplexa solidão;
tem de ser um raio que coincida com o eixo do universo
e vá de uma à outra ponta
e me cegue de tal modo
que eu posso finalmente
ver a luz do outro lado -
António Simões, in ( poemas antigos ), inédito.

23/09/2006

Um som profundo do Outono

Como a floresta, faz de mim a tua lira
importa que também as minhas folhas caiam
o tumulto das tuas poderosas harmonias
virá arrancar-nos

um som profundo do Outono
suave, apesar da sua tristeza
Percy Bysshe Shelley ( 1792-1822 )
__________________________
enviado por Amélia Pais
http://barcosflores.blogspot.com
http://cristalina.multiply.com

22/09/2006

o elogio dos sentidos

A caminho do Outono, apressadas, correm as árvores pela paisagem fora. Já são de ouro as cores das folhas que se espalham pelas mãos, à beira de todos os caminhos do corpo, quando o vento anuncia chuva e refresca os olhos cansados de tanta viagem pelo deserto das emoções.
Vamos, em breve, iniciar um outro ciclo de encontros desencontrados, como se o Outono tivesse que ser a estação de partida e de chegada de todas as viagens empreendidas ao sabor da memória e dos dias que a justificam.
Vamos, por certo, atravessar os extensos campos de arroz ( Orysa sativa ) quando os homens e as máquinas já se preparam para a ceifa das espigas maduras e alguns bandos de garças boieiras ( Bubulcus ibis ) ensaiam voos de migração rumo ao sul, rumo à Primavera de todas as aves.
Vamos, ainda, deixar os olhos recordar o verde do vale quando a luz rasante da manhã enobrecia os tons vários dos arrozais, ou quando as cores do poente pareciam antecipar-lhes a maturação. E o Mondego, de permeio, sempre a dividir a jornada entre a ida e a volta, como se ter que atravessar uma ponte fosse a mais correcta desculpa para tudo o que os olhos desejam: habitar, por exemplo, as ruas e os largos daquela aldeia do poeta Afonso Duarte, que a memória ainda vê rodeada de água por todos os lados, qual ilha perdida na bruma dos campos alagados pelas águas férteis de um Inverno que o rio deixou sair das suas margens. De longe, através das janelas de uma velha carruagem de terceira classe, vemos, ainda, nítidas, as casas reflectidas no vasto espelho da manhã, só quebrado aqui e ali pelos ramos angustiados das árvores que tentam sobreviver a tal tormento, enquanto o comboio se afasta, ronceiro, contornando os campos semeados de água e desespero.
Vamos, pois, ter esperança nas viagens que havemos de fazer pelas cores adentro que as árvores, propositadamente, foram abandonando em nossas mãos. E não deixaremos que tal esperança desapareça nas águas quando elas baixarem e quase só alimentarem as valas de enxugo que vão riscar a paisagem como esteiras de luz, anunciando, assim, o fim de todos os invernos. Começam, então, os primeiros amanhos dos campos, com os animais e as máquinas a lavrarem a terra e a água onde crescerão as espigas que iluminam o nosso contentamento de hoje.
Vamos, sobretudo, fazer o elogio dos sentidos que permitem ao corpo o sustento das mãos, espalhando, como adubo natural, as boas recordações de ontem sobre todos os campos agora já arados, para que as espigas cresçam mais depressa e o grão seja mais suculento.
Assim, a boca agradecerá a festa e o esforço.
Augusto Mota, inédito, in "A Geografia do Prazer", 2000.

21/09/2006

Chegou o Outono

Legenda Íntima 128. Augusto Mota
"O Outono é a Primavera do Inverno "

19/09/2006

Legenda Íntima 125. Augusto Mota.

as rotas do cársico

Os olhos viajam sozinhos pelos caminhos da serra, enquanto a tarde vai diluindo a paisagem no horizonte longínquo, para lá do rio que nos atravessa o corpo e das pontes que atravessam o rio. Pelas rotas do cársico remamos, então, sem destino, ao sabor do tempo que escorre lento pelas aldeias sombreadas do vale. Umas vezes passamos sob as pontes que ligam o passado e o futuro. Outras, passamos sobre aquelas que nos levam ao encontro do presente. Mas em todas navegamos, como se a água fosse a via certa para esta memória do presente.
Cruzando pontes, navegamos recordações. Cruzando recordações, lançamos pontes através dos espaços vazios entre os dedos, quando estes só servem para contar as horas que sobram para a viagem de regresso.
Regressamos ao presente. No mercado de todos os afazeres compramos o tempo que, antes, não tivemos. E passamos sobre pontes que, antes, só passáramos por debaixo, enquanto remávamos, ausentes, em direcção aos algares da memória. E cruzamos a serra em todas as direcções, já que uma subterrânea engenharia nos quis facilitar a inversão do curso dos rios que, agora, como dois mensageiros da noite, correm paralelos rumo aos oceanos perdidos entre o futuro e os continentes das nossas próprias emoções.
Augusto Mota, inédito, in "Geografia do Prazer", 2000.

17/09/2006


Fotopoema 70. Augusto Mota.

10. É só virar a mão

Não me chores quando eu partir:
vou para o outro lado,
para o avesso da vida -
É só virar a mão:
e tens-me de corpo e alma
na concha da tua palma.
António Simões, ( poemas antigos ),inédito

11/09/2006

11 de setembro de 2001

Fotografia de M. Atkinson, in "G.Emini"

Ana Miguel ( 5 anos! sentada ao colo da Avó, Fernanda Sal Monteiro, numa varanda sobre o mar em Olhos d'Água, Albufeira, Algarve )

hoje ,dia 11 de Setembro de 2006 ,todas as estações de televisão ,todas as estações de rádio ,todos os jornais ,nacionais e estrangeiros ,abriram os seus noticiários ou iniciaram os seus editoriais com notícias ou escreveram notas de primeira página sobre o atentado ,mediático ,perpetrado ,há cinco anos ,contra as Torres Gémeas ,em Nova Iorque .foi, segundo alguns analistas ,o facto que mudou a História do Mundo Contemporâneo ,e ,que obrigou/justificou alguns dos maiores erros cometidos pela administração norte americana contra Estados ,ditos teocráticos ,regimes ditatoriais, inventadas ameaças ,ou ,ainda por explicar ,perigos nucleares
.sei ,e como eu a grande maioria das mulheres que não quero ser obrigada a usar uma "burka" ,como sei que quero - 1º - viver e pensar ,sem maniqueísmos de qualquer ordem - 2º - acreditar ser possível construir ,em liberdade ,o meu futuro e o dos meus congéneres - 3º - defender ,de boa fé ,os princípios e valores que acredito e nos quais fui educada
.não sei
fazer futurologia
.não sei
o que inventarão os existentes ,ou novos ,totalitarismos ou outros ismos ,fazedores de guerra
.mas
sei
que quero contribuir para viabilizar

...*...*...*...


.-. Avó, hoje fui a primeira a ver a estrelinha da madrugada!
.-. já reparaste que ela anda sempre perto da lua?
.-. as outras estrelas não brilham tanto...
.-.ela não é bem uma estrela como as outras. É um planeta. É Vénus.
...
.-. Avó, onde dormem as estrelas?
.-. não dormem... Estão sempre no céu.
.-. então, estão coladinhas no céu?
...
.-. Avó, onde dorme o vento?
.-. não sei Ana. Onde será?
.-. se calhar dorme por cima das nuvens...
.-. talvez. É um sítio bonito para dormir.
...
.-. E a chuva, Ana? Onde imaginas tu que ela dorme?
...
.-. Oh, Avó! Talvez dentro das nuvens...
Fernanda Sal Monteiro, 13 de Agosto de 2006 veja

08/09/2006

Há 385 anos...

Jean de La Fontaine,
poeta francês,
nasceu em Château-Tierry, Aisne.
Espírito irreverente, livre e independente, morreu em Paris em 1695.
A Gralha entre os Pavões
Pavão que andava na muda,
sua plumagem largou,
e uma gralha presunçosa
com ela o corpo adornou.
Entre um rancho de pavões
atrevida se meteu,
até que um dos camaradas
a impostora conheceu.
Passou palra aos companheiros,
que em cima dela saltaram,
e não só o adorno alheio,
mas o prório lhe tiraram.
Voltou para as companheiras,
que do sucesso informadas,
a baniram do seu rancho
ao som de mil apupadas.
O que sucedeu à gralha
aos homens pode convir;
aquele que alheio veste,
o vem na praça a despir.
Este caso, além do exposto,
serve também de lição
a todos os que procuram
parecer mais do que são.
Trad. de Curvo Semedo
Enviado por Amélia Pais

07/09/2006

Legenda Íntima 126. Augusto Mota.

estático êxtase

Saborear o perfume dos frutos de uma líchia ( Litchi chinensis ) é como deixar as mãos navegar à sombra das pétalas de todas as rosas que já enfeitaram a esperança dos dias, quando as estações do ano se contavam pela germinação das sementes e pelos frutos que, ansiosamente, guardávamos nos olhos. Mas descascar minuciosamente a casca coriácea de uma líchia, sem ferir a sua polpa sumarenta, é como abandonar a boca ao prazer de todos os frutos exóticos que se escondem, ávidos, atrás das finas roupagens da memória.
A noite é pródiga em tal caminhar pelos saborosos segredos da botânica, mesmo quando a azáfama dos dias nos afasta do mercado de todas as secretas e sensatas sensações. Assim penamos, extáticos, entre as gratas recordações das mãos e o sabor daquela memória que guardamos tão ciosamente como se fosse a secreta receita de um sofisticado licor. Por isso a boca antecipa o que os olhos, gulosos, já não conseguem disfarçar ao ver chegar de longe, pé ante pé, os sábios requintes da madrugada. Neles descansamos o corpo exausto. Neles adivinhamos a repetição dos dias. E neles semeamos, a esmo, erva-cabecinha, ou perpétua-das-areias ( Helichrysum angustifolium ), para que as suas flores animem, com um aroma de culinária exótica, o que ainda resta do sabor das tardes quentes, ou para, com elas bem secas, enchermos as almofadas que nos amparam o sono dorido e os sonhos vigilantes.
É estático este êxtase que adormece o silêncio e a noite, como se a Glória de uma missa-cantilena acabasse, agora mesmo, de percorrer a nave de uma catedral gótica e deixasse as mãos perdidas ante a imponência das colunas e a hesitação dos olhos que, temerosos, vagueiam pelo transepto em busca do infinito de nós.
Augusto Mota, inédito, in "Geografia do Prazer", 2000.