23/12/2018

Texto transversal









15/12/2018

Texto transversal






Ao concluir este texto fiquei com a dúvida se ele seria uma metáfora, ou uma metonímia. Parecendo-me que estariam presentes ambas as figuras de estilo, fui pesquisar na net se não haveria o termo “metonímia-metafórica”. Não há. Mas há metafotonímia
Vejamos: 
METONÍMIA é a figura de linguagem que pode definir-se como a substituição de uma palavra por outra, quando há relação de contiguidade, ou seja, proximidade de sentido entre elas. 
METÁFORA é uma comparação abreviada em que o verbo não está expresso, mas subentendido, havendo uma transferência de significados na base da semelhança. 
Para alguns autores, porém, como por exemplo Louis Goossens (2003), a metonímia, em muitos casos, deve ser vista como parte integrante da metáfora, pelo que, então, foi criado um novo vocábulo para designar tal situação: “metaphtonymy”, em português METAFOTONÍMIA. Já estes “textos transversais” serão tecnicamente EKPHRASIS, palavra grega que designa uma descrição ou comentário literário sobre uma obra de arte, a qual actua no sentido de expressar ideias e sentimentos, reforçando assim o conteúdo do texto verbal. “A carta aos meus filhos sobre os fuzilamentos de Goya”, de Jorge de Sena, é considerada o melhor exemplo da poesia ecfrástica portuguesa.    




09/12/2018

Café com Livros






Aconteceu em Leiria, no m|i|mo – museu da imagem em movimento - no dia 24 de novembro, o já habitual “Café com Livros”. Teve como convidado o jornalista e escritor João Morgado, que veio apresentar o seu mais recente romance histórico: «O Livro do Império».
 

João Morgado é um escritor profícuo, bastante acarinhado pela crítica e que que já conta com uma vasta obra publicada. Já é quase um escritor residente no espaço literário “Café com Livros”, onde já esteve 3 vezes, sendo que a última vez veio apresentar o livro «Índias» no Museu Moinho do Papel.


Muito atento aos locais por onde passa, encantou-o a beleza rústica do Moinho do Papel e, por isso, no agora apresentado «O Livro do Império», dedicou-lhe uma referência, que nos encheu de vaidade e também envaidecerá, com certeza, a cidade e o respetivo espaço museológico.
Foi em verdadeiro ambiente de proximidade que Cristina Flores, Lídia Delgado, David Teles e Clara Antunes foram ilustrando a tertúlia com a leitura de poesia e excertos da obra apresentada.



Rosa Neves fez a seguinte apresentação/crítica de «O Livro do Império»:

 “João Morgado revisitou a história, e mostra-nos uma realidade diferente daquela que habitualmente é conhecida; resgatou um momento e foi procurar factos esquecidos ou desconhecidos, reconstruindo, com minúcia, acontecimentos, personagens e costumes da época.
Não se limitou à narração, mas afoitou-se no terreno da interrogação. Há neste livro um trabalho de investigação aprimorado. Há rigor na consulta, utilização e cruzamento das fontes que estabelecem a relação entre a narrativa e os factos históricos.
 
Clara Antunes

Lídia Delgado
Através de uma descrição minuciosa, o autor criou uma estratégia de narrativa fluida, consistente e apelativa: devolve as personagens à sua época, colocando-as num diálogo de proximidade com o leitor, criando assim um espaço de confluência entre a ficção, a história e o leitor.
Há nesta obra um narrador que conhece muito bem os espaços temporais em que se move: é analítico, metódico, e guia o leitor pelo espaço da objetividade. 
 
David Teles

David Teles e Cristina Flores numa leitura teatralizada

Para ilustrar os modos de falar e os costumes da época, o autor recorre ao uso de arcaísmos, quer a nível lexical, quer a nível sintático e afirma a narrativa com o uso de frases longas e descritivas. Seguindo outro dos pressupostos deste género literário, há também a preocupação com o caráter educativo da obra, já que o romance histórico também é um veículo de ensino da história. A fidelidade histórica é outra das preocupações do autor, já que nos dá a conhecer, através de inúmeras notas finais e de rodapé, os documentos consultados durante o processo de investigação e que atestam a veracidade dos factos reais descritos.
João Morgado chama a atenção dos leitores não só para a importância de «Os Lusíadas», enquanto poema épico, mas para a importância que a Língua Portuguesa assume a partir da sua publicação, já que esta obra, não só narrou os factos de um povo, mas sagrou-se um marco na afirmação da Língua Portuguesa enquanto símbolo da nação.  
“Que outra obra é de fala purgada de castelhano e latim, que possa ser chamada de … língua portuguesa? - (Questão colocada pela Infanta D. Maria a seu irmão Cardeal D. Henrique).


Do ponto de vista do conteúdo, o livro fala-nos de um Império que já não é o que era, um reino que não é o que parece. Havia um império decadente e corrupto, governado por um rei Desejado, imaturo e sonhador que vivia inebriado com a quimera da glória e o devaneio da imortalidade.
“Portugal tem um império em declínio, com um rei destemido, mas influenciado por uma nobreza e um clero corruptos. Omnipotente, a Inquisição não hesita em prender, matar e destruir as mentes e as obras mais brilhantes” (Damião de Góis e Garcia de Horta, entre outros).

  
Carmen Matos, João Morgado e Cristina Flores

João Morgado fez o desenho do xadrez político que dominava Portugal. Imiscuiu-se nos segredos da Corte e da Inquisição e oferece-nos agora uma obra provocatória que nos faz recuar à agonia do Império português, resgatando segredos de uma obra proscrita, que, por um lado louvava os feitos do passado, e por outro lado ousava denunciar a corrupção dos mais poderosos.
O livro inicia-se com uma conversa conspiratória ficcionada, entre duas personagens que aludem à grande urgência de tudo fazer para travar Camões e impedir, por todos os meios, que os seus versos épicos viessem a ser publicados.
Juntos, Camões e «Os Lusíadas», são a personagem central deste livro! Há um antes e um depois do regresso de Camões a Lisboa; há uma Lisboa ansiada, mas desaparecida; há uma luta desabrida com a Inquisição.
Destacam-se como personagens de suporte à trama, dois grandes amigos de Camões, os nobres Diogo de Couto e D. Manuel de Portugal, estrategas na luta contra os inimigos de Camões e dispostos a tudo para o ajudar a publicar “As Lusíadas, assim se chamava o poema antes de ser censurado pela Inquisição. Em oposição a estes, percorrem a obra à mesma velocidade, os irmãos jesuítas Luiz e Martim Gonçalves da Câmara, estrategas na arte de tudo fazer para destruir a obra de Camões. Tudo isto, entre os devaneios de D. Sebastião que se assume predestinado a imortalizar-se, afrontando os mouros no Norte de África. 


Assim, desde o afastamento de Camões da Corte, a perda do olho direito nas terras do Norte de África; a ida para a Índia e o seu regresso a Lisboa; entre a prisão, as bebedeiras, as brigas e a doença, ficaram, o amor de sua mãe, e duas recordações amorosas que lhe marcaram a alma: Violante, seu amor de juventude, e a Infanta D. Maria, o amor casto e inatingível! Mas, apenas uma vontade o fazia resistir a tudo, a mesma que o mantinha vivo: a vontade inabalável de ver publicados os seus versos.
Camões tinha dentro de si um fogo que havia de o acompanhar a vida toda: o fogo das palavras! Com elas ia acendendo o fogo das paixões, mas também ia acendendo o fogo da inveja daqueles que, embora negando-o, sabiam o génio da sua veia e inspiração poéticas.
Camões tinha bebido o pensamento e o saber poético dos grandes autores, tinha conhecido outros mundos, era senhor de uma eloquência invulgar, rasgava os pressupostos poéticos daquela época. Era briguento, contestatário e politicamente incorreto. Tudo isto eram predicados que não agradavam aos decisores políticos e poetas reais! Mas sobretudo, Camões tinha dois defeitos imperdoáveis: era arrojado nas paixões e inigualável na poesia.  
«O Livro do Império» tinha tudo, mas tudo, para acabar na fogueira da Inquisição, mas, afinal, chegou aos nossos dias!
João Morgado conta-nos de que águas, de que chamas e de que prisões foram salvos «Os Lusíadas», e que preço teve Camões de pagar para que, a obra da sua vida, vencesse os obstáculos do obscurantismo, da corrupção e da maldade.
«O Livro do Império» narra a “vida” de uma obra e a luta de Camões para a salvar e publicar! Não narra a vida de um poeta herói, mas de um Camões, pobre, doente e escorraçado da vida, mas na esperança de que a lei da morte, também a si libertasse… 
Um livro a não perder.






Feita a apresentação/crítica, foi a vez de João Morgado falar sobre os motivos e curiosidades que o levaram à concretização deste romance histórico. O autor, com a eloquência e desenvoltura que o caraterizam foi satisfazendo a curiosidade de todos, convertendo também este “Café com Livros” num verdadeiro espaço de revelações e curiosidades histórico/literárias. 


O relógio não para e por isso tivemos de dar por encerrada a sessão, não sem antes o questionarmos sobre qual será a próxima obra…
Obrigada João Morgado pela belíssima tarde de cultura. Cuidaremos bem de «O Livro do Império»!
Até sempre, até à próxima… 

Voltaremos a encontrar-nos no próximo mês de janeiro, em local a anunciar.

Até lá não recusem

                               um café quente

                                          um livro fresco

 
                                                         uma ideia nova



Texto de Rosa Neves
Fotos de Joaquim Cordeiro Pereira e (telemóvel de) Carmen Matos
Edição de Augusto Mota


07/12/2018

Prótea



Protea cynaroides "Little Prince"








11/11/2018

Café com livros






Por razões logísticas só agora é possível editar a reportagem da tertúlia “Café com Livros” de 29 de Setembro, p.p., realizada no museu Moinho do Papel, tendo como convidada a escritora e jornalista Alice Vieira

 

A jovem violinista russa Dinara Tonkikh, residente em Leiria, iniciou a sessão executando, com maestria, duas peças clássicas dedicadas à nossa convidada.

 

“As Alices que há em mim” foi o mote para que, em ambiente intimista, Alice Vieira viesse partilhar connosco a história de uma escritora que, fruto do acaso ou do destino, entre pais, filhos e avós, já marcou gerações de leitores.
  

A Alice das nossas vidas é Senhora de Gargalhada fácil, franca e aberta. Uma Alice que nunca quis ser escritora, sempre quis ser jornalista e acabou por ser (muito bem!) as duas coisas.
A Alice menina foi criada com os Tios-avós, republicanos austeros. Cresceu sozinha, e os amigos que tinha eram as personagens dos livros que lia. Seguia-lhes os passos e falava com elas.
A sua formação escolar foi feita em casa e só quando foi para o liceu é que contactou com jovens da sua idade. A jovem Alice foi para o Liceu Filipa de Lencastre, escola que considera ter sido a sua casa de adolescente e onde se orgulha de ver gravado, atualmente, o seu nome na sala de aula que frequentava. Um prestígio para Alice Mulher, uma marca da Alice Adolescente, Escritora, Jornalista.



Alice refere a sua prima Maria Lamas como a grande influência na decisão de ser jornalista. Outro fator que pesou na decisão foi quando percebeu que o jornalista nunca estava em casa. Soube imediatamente que era essa a vida que queria,  uma vida que a levasse para fora de casa, uma vida que a levasse à procura de pessoas, de factos, de notícias…
Profissionalizou-se muito nova, com 18 anos. Foi uma mulher arrojada para a sua época, desafiadora de normas e de costumes bafientos e preconceituosos. Viveu em Paris até Maio de 69, onde contactou com escritores, artistas e outros intelectuais exilados. 
Nunca quis ser escritora, no entanto, acha que a escrita já vinha com ela, nasceu com jeito… não gostava de redações à medida… só gostava de redações onde pudesse falar, reinventar as personagens dos livros que lia.
Já publicou cerca de 80 livros. A maior parte deles são dirigidos a jovens – também tem uma coleção de histórias tradicionais portuguesas para os mais pequenos - mas o que mais gosta é de escrever romance. 


Mercília Francisco lendo um poema de «Olha-me como quem chove»
Apesar de confessar que sempre escreveu poesia, tendo mesmo mostrado nesta sessão de “Café com Livros” um livro inédito que ela própria fez, que nunca foi publicado e que só poucos amigos conhecem. Uma relíquia que lhe agradecemos ter partilhado connosco. A publicação de poesia é recente. Revela que é muito crítica em relação a tudo o que escreve, no entanto, em relação à poesia é muito mais crítica … Talvez, por isso, escreva muita poesia, mas publique muito pouco. Conhecem-se os seguintes livros:
2007 «Dois corpos tombados na água» - Prémio Literário Maria Amália Vaz de Carvalho
2009   «O que dói às aves» 
2014 « Os armários da noite»  
2018 « Olha-me como quem chove»
  
Dinara Tonkikh com a sua amiga ucraniana Olga Volkova e Rosa Neves

Alice vai buscar a epígrafe dos seus livros de poesia a outros poetas seus amigos como, por exemplo, José Tolentino de Mendonça, Ruy Belo, Nuno Júdice e Daniel Faria, pelos quais nutre uma admiração imensa.
Ao contrário dos outros géneros, este é o único que escreve sempre à mão, e diz: “Não consigo explicar por que isto acontece. Acho que sou outra pessoa quando escrevo poesia. É quase qualquer coisa que me acontece como se me fosse ditado.”


A sua poesia é de uma sensibilidade extrema. Lê-la e conhecê-la é um exercício de intimismo, de reflexão, de observação de pormenores.
Os seus livros de poesia tem todos a mesma linha poética. A experiência de vida serve de matéria-prima ao ato criador de Alice, já que, a Alice Poeta não se liberta da Alice Jornalista, conseguindo fazer o leitor sentir, com intensidade, aquilo que ela escreve, tal como se fosse jornalista de sentidos, cuja missão é levar aos outros, emoções vividas em corpos e lugares longínquos.
 

A sua poesia é adulta e para adultos, intimista, mas realista, é uma viagem pela vida, onde a nostalgia e a saudade, são portos de chegada e partida de amores e desamores. Há intensos sentimentos que percorrem as veias da sua poesia. A expressão madura e clara da sua escrita ilude-nos, ao ponto de pensarmos que somos nós que experienciámos aquelas sensações e conhecemos aqueles lugares.
Percorre a sua poesia uma sensualidade discreta, mas concreta, circunstancial. Nas palavras que nos escreve e naquelas que nos instiga a adivinhar, ela transforma o mais pequeno gesto numa metáfora elegante e sedutora …
Alice mete a vida toda na sua poesia e nela está o registo voraz da passagem do tempo e dos amores; a marca indelével das emoções assumidas e sem idade. 

  

Foi pouco o tempo para estar com Alice Vieira; foi pouco o tempo para ouvir a sua poesia, a sua história. Mas, “Café com Livros” é apenas uma passagem breve para o futuro de outros encontros…
Obrigada Alice, por todas as Alices que há em si …



“É com palavras que te vou guardar

na praia do meu corpo. E através delas

dar-te vida para sempre.”

…/…

«Olha-me como quem chove» - Pág. 68
 Alice Vieira





Voltamos a encontrar-nos no próximo dia 24 deste mês de Novembro, no auditório do m|i|mo - museu da imagem em movimento, onde o escritor João Morgado, autor de «Vera Cruz», virá apresentar a sua última obra: «O Livro do Império» - um manuscrito resgatado pela Inquisição para redenção de Portugal.




Até lá não recusem

                            um café quente
 
                                          um livro fresco

 
                                                         uma ideia nova





Texto de Rosa Neves
Fotos de Joaquim Cordeiro Pereira
Edição de Augusto Mota