LITANIA DE SOMBRA
Não perguntem nada: nós estamos dentro
do aro de frio, no frio do
muro,
tão longe da feira do Tempo!
Não perguntem nada.
Nós estamos mudos.
Puseram açaimes nas ventas
do vento,
ergueram açudes nas
águas do mar...
Não perguntem nada: nós
estamos dentro,
ou fora de tudo.
Não perguntem nada.
Tumulto na estrada? O bicho
na concha.
Miséria na casa? O farol na
montra.
Não perguntem nada, não
perguntem nada:
há sempre gládios
a
ríspida sombra.
Não perguntem nada: as razões são tristes.
Não perguntem nada: nós estamos contra.
E talvez perdidos.
E talvez perdidos.
David Mourão-Ferreira, in Canto IV de «OS QUATRO CANTOS DO TEMPO» (1953-1958)
Fotos: Augusto Mota / teias de aranha orvalhadas (com manipulação cromática)
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