atravessam o sono e os incêndios
abrem-se pelas esferas complexas, onde os peixes
silenciosos vagueiam, abrindo a luz do meu nome. Na terra húmida, há sombras assimétricas.
Nelas, revejo os celeiros, as colheitas, as torrentes,
onde o azul se abandona.
Há um clamor nupcial, uma turbulência adormecida,
entre plátanos dourados;
um odor de jasmim moldando a areia misteriosa:
um perfil de veludo, lavrando o ardor, a inquietude,
um octeto de cordas ( uma peça de Brahms )
acompanhando o meu sonho de corais nocturnos. A respiração vive então o seu próprio silêncio inquietante,
os seus meandros translúcidos,
nas arestas pulsáteis que irradiam as artérias vivas,
enquanto um sopro de luz inunda os dedos antigos
de vertebrados fósseis.
O silêncio, esse, renova-se, esquecido, na vertigem branca
dos turbilhões do sono. As árvores expandem-se,voltam a ser verdes,
entre um violoncelo, um perfume lembrando orquídeas,
as vagas negras do mar, o leito silencioso dos peixes:
a espuma celebra essências,
láudano e nenúfares, sombra e cicatrizes,
e a água flutua, na rosa dos nomes,
transformando a líquida fusão que me invade,
quando digo as turquesas, o mar de espelhos límpidos,
na noite silenciosa,
onde sou o silêncio de todas as coisas.
Maria do Sameiro Barroso, in "Meandros Translúcidos".
5 comentários:
Dois grandes Poetas cruzaram-se neste universo e a Poesia - no feminino e masculino - ficou mais rica...
Dos poemas mais inspirados e conseguidos que tenho lido nos últimos dias.
Do sul, um abraço, Maria do Sameiro!
Não conhecia a Maria do Sameiro. Descobria-a o ano passado, em Silves, durante a II Bienal de Poesia e dela vou sabendo e lendo, aqui, no Palácio das Varandas. Gosto da maneira densa com que escreve, por um lado, e das imagens etéreas com que vai preenchendo os seus poemas... e, aos poucos vou imaginando, ao ler, o mundo rico que lhe vai na alma.
Conheço a poesia de Maria do Sameiro.
Mas espero, ansiosa, a saída deste livro, porque, estes dois poemas pré-publicados aguçaram-me a curiosidade para os demais.
Do que de melhor tenho lido em Poesia em 2006.
Felicito-a, Maria do Sameiro!
O outro lado do abraço, consentido. O poema, vivido, em meandros tais que se transfiguram em vitrais translúcidos.
Imagens de uma beleza invulgar, estes poemas pré-publicados.
Bem hajam!
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