Quando eu for livre,
do corpo liberto,
dirão: "onde vive
ele agora ao certo?" Vivo no anil,
do ar me alimento -
meu corpo subtil
mais leve que o vento. Vivo onde a asa
não se aventura:
a alma tão alta
deceu à fundura. E agora voa
no céu de si mesma,
e atravessa a sombra
para a luz que a cega. Essa luz cegante
vai-me por à prova:
pra seguir adiante
só com vista nova
"Quando eu me for...",
não é bem assim:
morte é o amor
que volta para mim.
vou nascer de novo -
dá-se novo parto,
tenho outro corpo, que é feito da luz
que na carne ardia,
e a carne reduz
à cinza mais fria.
Mas enquanto habito
o corpo de agora,
o prazer infinito
da dor me devora - Nela canto e ardo,
dela me alimento,
e sei que não tardo:
chegará o tempo de voltar ao Pai -
viva-se entretanto!
Amigos, cantai
dentro do meu canto.
António Simões ,inédito , in "Poemas Antigos".
Fotopoema 76- poema de António Simões. Fotografia e composição de Augusto Mota.
Fotopoema 78 - poema de Fernanda sal Monteiro. Fotografia e composição de Augusto Mota.