31/10/2007

cantos de outro tempo - 1ª série


1. esperança
noite funda, amor;
absurda e louca noite longa
em que ninguém adormece.

tua mão na minha - uma flor!
( a esperança que o amor prolonga )
- e em nossas mãos amanhece!


2. sim
irmão, é aqui -
é aqui que o mumdo acaba e principia,
onde as crianças riem dos mistérios

e os rios correm sem metáforas;
onde os homens de pedra envelhecem
e os deuses ressonam e cheiram mal dos pés:
é aqui.
AQUI-AMANHÃ


António Simões, inéditos, "cantos de outro tempo".
Textos Transversais de Augusto Mota.

24/10/2007

a faina maior

Os comboios partem antes de nos transportarem ao destino mais conveniente .Sem bilhete, nem moeda corrente, como num pesadelo, acordamos no cais de embarque de uma apressada estação ferroviária, estranha e estrangeira, onde não há ligação, em tempo útil, para o interior de nós.
Há mulheres a abraçar despedidas e a oferecer os doces tradicionais dos grandes entroncamentos ferroviários . Já não sabemos para onde vamos. Vamos. E sujeitamo-nos a viajar numa carruagem em jeito de bancada, na companhia de altas patentes de um exército da noite, como se assistíssemos à final de um jogo de guerra. Iniciamos a viagem. O revisor começa a sua tarefa. Sem bilhete, disfarçamos a angústia atrás dos galões reluzentes dos generais que connosco viajam para um campo de batalha desconhecido. O revisor, agora também ele general, toma o comando das operações e o comboio apita em direcção ao cais dos lugares que nos hão-de levar a uma Terra Nova qualquer, onde a faina maior será a pesca à linha das nossas próprias emoções.
Os pesadelos da noite antecipam sempre, teimosamente, as angústias que se alimentam da memória de ontem. Por isso os dias pesam mais sobre o corpo. Por isso, as mãos, exaustas, adormecem junto à fogueira, quando lhes apeteceria mais traçar, nos mapas do tempo, as rotas de outras viagens. Por isso os olhos, atentos, se ausentam na distância que vai de uma estação ao cais da madrugada do dia seguinte. Por isso.

Augusto Mota, inédito, in "Geografia do Prazer", 2000.
Textos Transversais de Augusto Mota.

21/10/2007

as mãos

as mãos
as mãos todas
as mãos de toda a gente
as mãos de todas as coisas-
as mãos das árvores e das nuvens
as mãos das pedras e das flores
as mãos dos pântanos e dos rios
as mãos da terra e do mar;
tudo e toda a gente de mãos dadas
a lançar a semente da seara futura-
e as mãos do vento a escrever ternura no ar.
( para si ,Contra.Almirante ,o primeiro a cair nas "garras" do
grumete ,uma nova experiência ,feita com muita amizade ... e
não se zangue com sua - dele - ousadia )

16/10/2007

....................o verbo

uma experiência que ofereço aos meus amigos:
Fernanda Sal Monteiro
e
Augusto Mota
( como ,ainda ,não domino a técnica da filmagem ,com o à vontade que desejo ,não me atrevo a brincar com os vossos textos ... mas lá chegarei .prometo a toda a tripulação! )

13/10/2007

photoetrys ( da imagem ao texto )


uma pequena brincadeira de principiante também aqui

03/10/2007

Entregas

olha a minha pele, esta chama vermelha e azul
ardendo como papel, vibrando como lume
olha esta demora pelo corpo pelo cutelo
pala vibração do sangue pela tensão, estou mudo
olha a minha pele, a cor castanha, a veia negra, vermelha
olha este pulsar de mão, esta franca distensão, a veia azul

olha a minha pele nua, escura, tecendo como agulha
o risco, e nela o florescer do tempo neste instante
na corrente das horas permanece quente, dura
olha a minha pele, a carne, o lume que incendeia
continua aceso, agora o sangue alumia
e a nossa obsidiante teia irradia
a vibrante, a perfeita, a inconclusa teia.
olha a minha pele, olho a tua nela
no momento incandescente morremos
com a pulsão dos dentes mordemos
a luz comovente, aberta da janela
José Marto, inédito, 2006.
Fotografia e composição de Augusto Mota sobre poema de Maria Toscano.