21/01/2016

Rosário breve



É  ENGRAÇADO  MAS  FALO  A  SÉRIO 





Voltarei, nestas Presidenciais, a votar em Manuel de Arriaga.
É-me despiciendo o facto de o ilustre Terceirense (açoreano da Horta, n. 1840) estar fisicamente defunto desde 1917 – é no mesmo que voto na mesma.
Quero-me representado por uma figura de natural humanismo, de cívicas bondade & benevolência, de regrado carácter, de exemplar sentido de causa & serviço públicos, de alto empenho na justiça social – e, já agora, panteísta, que era como chamavam aos ecólogo-ambientalistas quando ainda era preciso meter deuses ao barulho de rerum natura.
Interessa-me, e muito, que o mais alto magistrado da Nação não seja um ganancioso predador-distribuidor de honras, ribaltas, milhões, clientelas & milhões. O Dr. Manuel de Arriaga não é, seguramente o não foi nem o será, desses. Quando eleito, foi o primeiro a ocupar o Palácio de Belémmas (note-se isto muito bem) por sua conta. O arrendamento de 100 escudos ao mês era satisfeito pelo bolso dele. Assim como a viatura automóvel que oficializou no cargo: comprou-a ele, acabando de pagá-la a prestações quando já resignara à Presidência. Sim, um homem assim interessa-me. Voltarei (sempre) a votar nele. Não tenho feito outra coisa, aliás. Quando foi do Soares, votei Manuel de Arriaga. Quando foi do (outro) Sampaio, votei Manuel de Arriaga. Quando foi disto, votei Manuel de Arriaga. E tenho ganhado sempre, ao contrário do País.
Sabendo-o adversário tenaz do analfabetismo (o do tempo que foi dele, à volta dos 80%; e o do nosso, que andará à volta do mesmo, evidenciando-se tal conclusão de uma rápida mirada às redes ditas sociais), tenho-o por aposta certa & vencedora nestes nossos tão desdentados dias. Agrada-me, além de tudo o mais, que a sua/dele Lucrécia não seja de Bórgia mas de Brito – e não do Vaticano mas da Ilha do Pico.
Sim, a minha cruzinha plebiscitará sem pestanejo o portador do primeiro Bilhete de Identidade alguma vez emitido pelo novel Registo Civil deste País.
E a quem eventualmente me acuse de eleger um morto, um fantasma, uma assombração, um espectro, uma múmia – ouvirá de mim a defesa acusadora de o mesmo terem feito, em recentes anos, os meus contemporâneos – e por dois mandatos consecutivos. 



Crónica de Daniel Abrunheiro, in «O Ribatejo», 21 de Janeiro, 2016

Ilustração obtida na net, com um grafismo laudatório característico da época

Edição de augusto mota 
 

1 comentário:

Daniel Abrunheiro disse...

Verifico, Caro Augusto, que Manuel já conta com dois votos. :)