20/02/2006

20 de Fevereiro. mais uma leitura encantada. hoje, "O poço dos desencantos", de Glória Maria Marreiros, com chancela da Campo de Letras.
a constante procura dos Outros ...
... para muitos escritores, a utilização da palavra destina-se a mascarar as suas emoções mais vivas. é a celebração do signo, quando a vida se salda numa desconcertante angústia. há quem escreva diários e memórias. Glória Maria Marreiros, porém, faz-nos acreditar que o acto de escrever está impregnado de uma necessidade de resistência tão forte, que a própria inteligibilidade se transforma em dor, em tristeza, em tormento.
por isso, "pensou este romance num momento muito difícil da sua vida que se tornou mais fácil de ultrapassar no convívio com as suas personagens. São figuras de ficção a cujos segredos ficou ligada e que decidiu desvendar. Assim nasceu este livro."
Glória M. Marreiros não ( será que não? ) se assume como romancista, e, muito menos, como uma espécie de Orfeu predicador. claro que a morte resolve muitas coisas. no caso de Carlos, um dos personagens do romance, a absurda democracia do nada, do vazio...
mas, Glória M. Marreiros, como a grande maioria dos escritores, não resolve a grande necessidade da sua vida: a necessidade de ter amigos. muitos amigos. a urgência de ser amada, muito amada. toda amada, diria mesmo ... projecção em Maria Helena, novo personagem do romance.
a sordidez da vida, o decorrente cortejo de desencantos e a projecção inconsciente do Eu, decorrem ao longo das páginas do livro, onde a visão do País, deste Portugal provinciano, possui uma densa carga informativa, na qual, porém, a emoção sobrepõe os sobressaltos de eventuais coeficientes políticos. escritora do social, o processo afectivo da sua narrativa vive, no entanto, de acontecimentos gerais, exprimindo muito mais movimentos de coração do que acções de ordem, ilusoriamente, revolucionária.
a "anima" do romance, em meu entender, consiste em relatar um momento de sombras, uma relação suspensa, um noivado impossível com uma certa forma de existência, e, sobretudo, um honesto sentido de culpabilidade.
a vida é precária, tão precária quanto as cosmovisões literárias.
e isto porquê?
porque também a Glória sabe que os escritores não fazem revoluções.
mas ela, como os demais, não repousa ao sétimo dia, apesar de lhes pertencer o reino dos céus - como afirmam certos críticos, portadores de vozes e ideias de outros.
Gabriela Rocha Martins, ao sétimo dia ...

4 comentários:

Anónimo disse...

uma incursão muito curiosa da Gória num novo registo. prometi que, terminado o reomance, lhe daria a minha opinião publica no Palácio. e isto porque a querida Glória andava desconfiada de que não tinha gostado do livro. e sabem porquê? porque, contrariamente, ao que costumo fazer, levei mais dias a ler esta obra.
e tão só, porque fui muito mais criteriosa...
danada, a Glória!

mas, independentemente, da minha opinião. não percam. vale mesmo a pena.
o livro tem a chancela da Campo de Letras.

Anónimo disse...

Com uma apresentação tão sentida feita pela Gabriela e conhecendo a sensibilidade da Glória, quem não se sente tentado a começar, desde já, a leitura ? Eu vou já procurá-lo ámanhã. Beijos para as duas.

Anónimo disse...

a menina é uma querida, Fernanda!

Anónimo disse...

Gostarei de ler esta autora. Parece-me, pela descrição da obra, intrigante.