MINHA MÃE AMASSA A VIDA
Minha mãe amassa a vida,
E a vida cabe-lhe inteira
Na farinha desmedida,E a vida cabe-lhe inteira
No infinito da peneira.
Minha mãe amassa e diz
Pra dentro do coração,Que só pode ser feliz
Quando os outros também são.
Minha mãe amassa e crê
Na grande família humana:Que o pão a todos se dê
E toda a gente se irmana.
Minha mãe amassa e teme,
O que pensando aprofunda,Com gente mesquinha ao leme,
A barca humana se afunda.
Minha mãe amassa e sabe
Que em seu grande coração,O Amor do mundo cabe,
O ódio, esse é que não.
E, enquanto amassa, escreve
Sobre a massa a levedar,Com essa grafia leve
Que o coração sabe usar.
E as palavras que escrevia,
Paz e Amor, passarão,Como em gesto de magia,
Pra dentro de cada pão.
Ela amassa enquanto lavra
O chão do seu pensamento:Amassa o chão da palavra,
Da palavra faz fermento.
António Simões
foto: Augusto Mota / Centro de um Hibisco (Hibiscus rosa-sinensis)
1 comentário:
Na sua aparente simplicidade, quanto amor, sabedoria e sensibilidade estas quadras encerram.
Obrigada pela partilha.
Júlia
Enviar um comentário