30/11/2014

de «Cronicão»



ESTUPIDEZ





Divide-se a estupidez em dois géneros. No primeiro caso, está aquela estupidez que só faz mal ao próprio. No segundo, a estupidez que, além de fazer bem ao seu portador, dá cabo da vida dos outros.
Todos somos estúpidos, de primeiro ou segundo grau. Tendemos a considerar que a razão sempre nos assiste, o que pode redundar em estupidez de primeiro nível. Se teimarmos muito nessa atitude, passamos com facilidade ao segundo. (Existe ainda, claro, uma terceira estupidez, que é a dos cronistas que pensam ter alguma coisa para ensinar ao mundo.)
Falo nisto hoje porque, tendo acordado um destes dias com a estupidez agarrada à pele como um perfume indesejável, passei o resto do dia a tentar que a estupidez de (alguns) outros não fizesse mal à minha. Foi um dia estúpido, naturalmente. Não o recomendo.
O remédio aparente é tornar-se cada um monge do seu íntimo mosteiro, devoto de um credo autista e misantropo. Sendo autista não (re)conhecer os outros e significando misantropo não gostar de ninguém. Mas é uma falsa cura para uma doença real.
A estupidez tem o futuro garantido. Sobretudo a de segundo grau. Quanto às de primeiro e terceiro géneros, essas não fazem mal a ninguém. Antes fizessem.

Daniel Abrunheiro, in «Cronicão | Gente do Touro de Ouro | Noite de Homens-Cantores», Publicenso - Imagem & Comunicação, Lda., 2003, p. 39

editado por augusto mota 


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