01/10/2005

Choro


José Gomes Ferreira, escritor, poeta e ficcionista português, nasceu no Porto em 1900. Formou-se em Direito em 1924, tendo sido cônsul na Noruega entre 1925 e 1929. Após o seu regresso a Portugal, enveredou pela carreira jornalística. Foi colaborador de vários jornais e revistas. Esteve ligado ao Grupo do Novo Cancioneiro, sendo geral o reconhecimento das afinidades entre a sua obra e o neo-realismo. José Gomes Ferreira foi um representante do artista social e politicamente empenhado, nas suas reacções e revoltas face aos problemas e injustiças do mundo. Mas a sua poética acusa influências tão variadas quanto a do empenhamento neo-realista, o visionarismo surrealista ou o saudosismo, numa dialéctica constante entre a irrealidade e a realidade, entre as tendências individualistas e a necessidade de partilhar o sofrimento dos outros...
José Gomes Ferreira morreu em 1985. Posted by Picasa
Ninguém vê as minhas lágrimas, mas choro
todas as humilhações das mulheres de joelhos nos tapetes da súplica
todos os vagabundos caídos ao luar onde o sol para atirar camélias
todas as prostitutas esbofeteadas pelos esqueletos de repente dos espelhos
todas as horas-da-morte nos casebres em que aranhas tecem vestidos
para o sopro do
silêncio
todas as crianças com cães batidos no crispar das bocas sujas
de miséria...
Ninguém vê as minhas lágrimas, mas choro...
Mas não por mim, ouviram?
Eu não preciso de lágrimas!
Eu não quero lágrimas!
Levanto-me e proíbo as estrelas de fingir que choram por mim!
Deixem-me para aqui, seco,
senhor de insónias e de cardos,
neste ódio enternecido
de chorar em segredo pelos outros
à espera daquele Dia
em que o meu coração
estoire de amor pela Terra
com as lágrimas públicas de pedra incendiada
a correrem-me nas faces
- num arrepio de Primavera
e de Castátrofe!

2 comentários:

Anónimo disse...

Eis o meu Poeta maior.
Tardavas em postá-lo, Gabriela.
Por mim e por todos os que amam a POESIA e, particularmente, José Gomes Ferreira, obrigada.

Também aqui não deixo de recordar Abril de 2005. A II Bienal de Poesia de Silves, e, José Gomes Ferreira, e muitos, tantos e bons mais...

Anónimo disse...

tão querida, miúda!
apanhaste-me...como tu, saudosa!
ok! somos duas parvas, paciência!