nem a obscura mitologia dos anjos, com a sua urina violácia,
mas algures a vida era possível, na sua extrema inocência,
porque eu sonhava com desertos puros,
contra o azul ultramarino, o mar e os violoncelos. Inventava Deus, a própria inocência, o sangue e as labaredas,
escrevia a infância azul - peixes coagulados,
doces glicínias, rodeada de sombras taciturnas,
florestas, orquestras verdes.
Escutava Brahms, o Concerto para violino e orquestra,
Opus 77. Tudo era insólito, excepto a beleza, rodando os sonhos,
cobertos de navios, triângulos perfeitos,
ânforas afundadas,
o peito cercado brilhando, o coração aceso,
como uma montanha, convocando o mel
e os rios longínquos, os cometas da dança. Não entendia o mundo, nem a linguagem de brumas
indizíveis, articulando o peito,
com a sua linguagem desmedida,
o corpo convocado para destruir incêndios, sonoros, impuros,
entre prímula e diamante,
desertos obscuros convocados para destruir todo o vazio,
pelos olhos químicos, transparentes,
a reunir claros contextos. Não entendia a linguagem do mundo.
Inventava Deus, a sidra amarga e cantava a cidreira doce,
a sidra azul,
e os rios eram tristes, pela imensidão tremenda.
Maria do Sameiro Barroso, inédito, in "Idades Sonâmbulas".
5 comentários:
Navegas sobre as nervuras de uma página em branco e inspiras o poema que há-de planar sobre a diáspora de um voo de ave.
Canto-te
na urgência febril deste poema,
e quando o fim - por ora - revisito,
reparo que fiquei aquém de ti.
Tudo se recria quando sai das mãos desta SENHORA/POETA.
Um beijo.
E nesta paleta de mil cores se contrói o poema.
os agradecimentos
- da gerência
( já sem coragem para mais acrescentar ).
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