A verde escrevo o sol que escorre pelas minhas mãos e tudo se dilui na saudade de infinito e nos desejos dos olhos claros da madrugada. Antes fosse um poema que perpetuasse os segundos que em mim ardem como bicos aguçados que sangram os lábios e a dor do futuro. Mas futuro é o presente que arde e sente, que fere e pressente o rosto que acaricia um horizonte de mãos entre as colinas da memória. Se o futuro é cada segundo que hoje vivemos, que se eternize o júbilo da sagração e se festeje cada gesto como dádiva sequiosa que inunda o corpo e percorre, em êxtase, os caminhos da cidade sitiada. Sobre as colinas de Jerusalém dormem as mãos e a boca dessa memória renascida das cruzadas, dessas lutas sem inimigo, desse esvair por dentro do passado sem futuro, ou do futuro sem presente. De qualquer modo sentem-se e pressentem-se as mãos que ardem entre as colinas da memória, agora rejuvenescida, e sentem-se e pressentem-se as lágrimas que escorrem entre os dedos do dia que amanhece. Serão contas, talvez, de um novo rosário de feitiços e encantamentos. Um outro sufrágio das mãos ritualiza, agradecido, uma nova religião de gestos em oferenda. O oficiante está pronto para as trindades do amanhecer! Augusto Mota, inédito, in "A Geografia do Prazer", 2000.
4 comentários:
Que sensibilidade maior!
De facto, a Primavera chegou e deixou rastos de flores mascaradas nas palavras do autor.
Um abraço, Augusto Mota!
« Se o futuro é cada segundo que hoje vivemos...»
O futuro também está nas minhas mãos, mas sempre na forma do presente.Vivido hora a hora com a sofreguidão de quem não sabe se voltará a beber. E assim, o presente tem mais razão de ser, e o futuro é mais verosímil. Na primavera a natureza renasce . Ao homem só lhe é permitido renascer a esperança no sonho...
Um abraço para todos.
muito obrigada, Fernanda.
mas ainda vale a pena sonhar, mesmo que, às vezes, o acordar seja muito feio...
mas entre um sonho e outro, valeu a pena!
Best regards from NY!
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