31/12/2005
feliz ano novo / happy new year*
I'd send you showers.
If hugs were a second
I'd send you hours.
If love was water
I'd send you the sea.
If a friendship was a person
I'd send you me.
( autoria desconhecida )
* Extensivos a todos os Amigos, Leitores,
e Visitantes, os votos de um belíssimo 2006
são, porém e especialmente, dedicados a
Glória Maria Marreiros
Maria Eugénia Cunhal
Maria do Sameiro Barroso
Augusto Mota
António Simões
Sandro William Junqueiro
e
Inocêncio Príncipe.
Feliz 2006!
o íntimo desígnio
29/12/2005
Zahra, A Moura Encantada de Leiria*
Sob os dedos da Lua
tríptico e cântico da fábula azul da eternidade.
Na frescura dos jardins, imaginava o paraíso da dálias,
murtas e lírios,
recriado nos ciclos de luz, nos ciclos do sol. Sob o signo de Capricórnio, havia rochedos brancos de sede
levantando-se, como uma rosa insurrecta,
sobre um vaso nacarado que iluminava o jade, a sombra azul,
as abelhas e as ametistas, entre as ruínas de Badedras,
Numeira ( as antigas cidades do Mar Morto ). Chamavam-se então Sodoma e Gomorra,
era quando os homens alojavam perversos mistérios,
sob o seu coração e viver era olhar o fogo inclinado,
entre as colunas de sal.
Olhar para trás era impossível. Era preciso deixar as paisagens desoladas e recriar a vida,
negra passiflora, sob os dedos da lua,
retirando a pele, camada sobre camada, e prosseguir,
pela sombra exausta,
porque as árvores refaziam a sua sombra milenar,
a verde folhagem. A treva moldava a sua flor.
Lot adormecera já sobre as cinzas das cidades perversas.
E tudo fazia sentido: o mar, a morte, o Deus Bíblico,
a treva e o húmus nocturno. Pelos vinhedos do céu, adivinha-se o mar,
e o silêncio descia, coberto de velaturas eternas.
E as luzes cobriam a terra que de novo se abria,
como um cálice nocturno, cálido e fecundo, como um dia de Verão. Maria do Sameiro Barroso, inédito, in "Idades Sonâmbulas".
27/12/2005
Cocacolizando
De um país que não regula da tola,
Decretaria, como medida urgente,
Que os políticos bebessem Coca-Cola; Da que tem cafeína, a mais potente,
A que tira o sono e os assola
Com um frenesim forte e fremente,
Que ao trabalho os prenda com firme argola. E dele, nunca nenhum desgrudasse,
E vinte e quatro horas trabalhasse,
Para que entre nos eixos este país. Até que saúde, ensino, e finanças,
Os hospitais, e o riso das crianças,
Assumam o rosto de um mundo feliz. A. Inocêncio Príncipe, inédito.
aliteração
26/12/2005
Odes Brancas
uma tranquilidade imensa, os sinos tocam
e os anjos sussurram-me a imperfeição terrena.
Nela escrevo as minhas odes brancas. No silêncio do mundo, as lareiras acendem-se,
as velas ardem e as estrelas cobrem as casas,
as árvores, as renas, as luzes de Belém.
Terna é a respiração das coisas. Entre a neve e os murmúrios, os pinheiros imensos
acendem-se, o sol esconde-se, uma chama vela,
e a vida descobre-se, no frémito, nas nuvens,
num sorriso de lágrimas. Talvez os anjos me soletrem, algures, na noite,
a fonte de luz e silêncio,
onde a vida passa, irrepetida e leve, nesse país,
aurora boreal, obscura, cadência de música, segredo brilhante
de poemas antigos,
Maria do Sameiro Barroso, inédito, 26 de Dezembro de 2004.
24/12/2005
*
O
B
R
A
-
A
M
I
R
(
P
A
I
)
gabriela rocha martins, inédito, in " cantigas de diabo e mal dizer".
* dedicado a todos os nossos Visitantes, no natal de 2005.
22/12/2005
Navidad...
21/12/2005
o canto infinito*
O Meu Natal... / dia 21 de Dezembro ( Solstício do Inverno )
19/12/2005
Don Quijote de la Mancha / Parte I / Comemoración de los 400 años
El Ingenioso Hidalgo...
En un lugar de la Mancha, de cujo nombre no quiero acodarme, no ha mucho tiempo que vivia un hidalgo... desses de lança no cabide, adaga antiga, rocim magro e galgo corredor (... ) A idade de nosso fidalgo rasava os cinquenta anos. Era de compleição rija, seco de carnes, enxuto de rosto, grande madrugador e amigo da caça (...) este sobredito fidalgo, nos passos em que estava ocioso - que eram os mais do ano - , era dado a ler livros de cavalaria, com tanto apego e gosto, que esqueceu quase por inteiro o exercício da caça e também a administração da sua fazenda(...) Em suma, enfrascou-se com tanto em sua leitura, que se lhe iam as noites lendo de uma assentada, e os dias de sol a sol; e assim, de pouco dormir e do muito ler, se lhe secou o cérebro de maneira que acabou por perder o juízo.
( D. Quixote - Parte I, Cap. I ) Para mim somente nasceu Dom Quixote, e eu para ele: ele soube obrar e eu escrever, somente os dois somos um. ( D. Quixote - Parte II, Cap. LXXIV ) Por supuesto. Vale.
Miguel de Cervantes de Saavedra ( Alcalá de Henares, 1547- Madrid, 1616 ).
17/12/2005
O Inconsciente
16/12/2005
Quadras & Quadros
Compaginando
Prò país inteiro o que acha ser preciso,
Flébil parlamento palra em surdina,
Entra a humana razão em pré-aviso.
Mas quando alguém mergulha na tina
E esfrega o lombo com Dove abrasivo,
Pla nossa mente passa, sibilina,
A certeza de perder-se o siso. Quando entre ais, uivos e dislates,
Com alface, cenoura, mas sem tomates,
O tempero falta à nacional salada; Quando não há bom senso e nada presta,
A gente pergunta: "Que Pátria é esta?",
E, perplexa, a Pátria fica calada. A. Inocêncio Príncipe, inédito.
12/12/2005
Candidatando
Plas ruas do país vão em passeio,
Falando ao povo, ternos e cordatos,
Sinto um fundado, lúcido receio. Pelas suas palavras, plos seus actos,
Plo que já se disse e nunca veio
Trazer ideias novas, novos factos,
Num discurso que é mais um devaneio. E ao vê-los passar em procissão
Pergunto: "Senhores, aonde vão?
O caminho é outro e é mais duro. Subam, sim, a montanha da verdade:
Em perdido vale, a humanidade
Há milénios que espera o futuro". A. Inocêncio Príncipe, inédito.
11/12/2005
Fulvo Esplendor
Néftis, a Núbia, templos do Neolítico, um capitel romano,
o ouro antigo.
Tinha desasseis anos.
As nuvens no céu perfilavam-se, como imaculadas vestais. No jardim, as dálias e as glicínias abriam-se.
Pela primavera, as laranjeiras floriam, brancas,
perfumadas, descobriam a sua doce letargia. O pólen acumulava-se.
Mas ainda não chegara o tempo de me desdobrar
em páginas manuscritas,
apenas me devorava a paixão sôfrega e atenta dos versos.
E interrogava-me, nesse fulvo esplendor, à beira do vazio.
Procurava o mar, o infinito. Arqueada no céu, a deusa Nut dava forma ao éter,
o seu corpo, como um sopro nocturno,
recamado de estrelas, invadia a memória,
trazendo um rasto incolor de íbis, chacais,
mandrágoras, lótus, perfumes da eternidade. Dividida entre as luzes e os perfumes, desenvolvia
o fulcro e as narrativas, entre todas as paisagens,
onde se enleavam os barcos, as necrópoles. Descobria Néftis, a Núbia, e os escaravelhos negros
pairavam sobre as sombras, refazendo o azul,
a perfeição, onde me encontrava com a harmonia do mundo. Maria do Sameiro Barroso, inédito, in "Idades Sonâmbulas".
zig - zag zag - zig
10/12/2005
Alavancando
Sinergias que são incontornáveis -
No rio revolto que é a nossa vida,
Agilizemos a fluidez dos sáveis. Como eles, ó gente empedernida,
Naveguemos as águas mais potáveis,
Elencando a escolha que é devida,
Numa terra onde há poucos notáveis. Demos-lhe a verdade que tanto tarda,
E numa asa ampla de abetarda,
Voemos pelos céus, sem onde ou quando. Façamos briefings, outsourcing até.
Multipliquemos por mil a nossa fé,
Alavancando, sempre alavancando. A. Inocêncio Príncipe, inédito.
04/12/2005
Quando Cheguei a Casa
encontrei no meu quarto um marujo
que aportara num bote ao meu guarda-vestidos
e se esforçava por descer, -
mas não sabia explicar por que ali se encontrava. Ontem surpreendi um rebanho de cabras
que pastava no meu tapete.
Ante-ontem um chinês
que provava a minha roupa e afirmava
não ter dado com a escada. Se amanhã um bando de gralhas enfiar pela janela dentro,
tal não será mais estranho do que se depois de amanhã
um elefante me pedir para o lavar. Coisas assim acontecem todas as noites.
Vou procurar outro quarto. Christoph Meckel.
meu amor
abre-me teu corpo -
quero ficar lá dentro
um pouco. tenho medo do mar:
deixa-me esconder
nas dunas de teus seios
até ele abrandar. tenho medo da noite
que agora principia:
encharca-me o rosto
na luz de teus olhos,
para que seja sempre dia. tenho medo de ter-te
só entre estes versos
e em mais lugar nenhum - tenho medo, meu amor,
de não ter amor algum. António Simões, inédito, 2003.
01/12/2005
A que trago dentro
Numa casa que é só pensamento -
Venho de longe, duma outra era,
Mas tu vives para além do tempo. Tu és a que foste, a que já era
Antes de o meu próprio nascimento,
E que minha alma sem saber trouxera
Nos sonhos que eu à noite invento. Teu avental feito de ar ou linho,
Preso à linha grácil da cintura,
Os braços puxando-me para ti. E na luz desses olhos adivinho
Uma emoção que tudo transfigura:
Foi sempre e só contigo que vivi. António Simões, inédito.
Augusto Mota - Um Sujeito (In)determinado
30/11/2005
H
O
M
E
M
CAMINHA CAMINHA
M
E
Glória Maria Marreiros, inédito.
29/11/2005
( requiem )
27/11/2005
No me olvido del vuelo
he transitado
sobre mis proprias muertes Me he visto transmutando
de gaviota a paloma
de halcón a águila He comido mis vísceras
regresado en mujer Me encuentro parada
en mis dos piernas transito
el último tramo del camino aún guardo las alas
en los rincones No me olvido del vuelo. Ana Mayol, inédito, Argentina.
O Canto, A Reminiscência
sombrias, liga as redes, o transe, os monumentos,
os remos e as rimas genesíacas,
a água ardente rumando, entre a proa e a popa, ao ocidente,
ao espírito de Deus, às nuvens, à neve e ao mercúrio
- um barco deslizando. Sempre ouvi falar da cabeça vazia, da vertigem
e do corpo que se despenha, em sereníssimos acufenos,
sobre um branco alfabeto que movimenta o sono,
revolvendo as sílabas roxas, como entranhas,
auras de pedra. Algures, um silêncio inventado, outra forma de existir,
o corpo hesitante escrevendo o canto, a reminiscência. Por vezes, tenho pensado que poderia escrever o meu lugar,
quando inóspita era a matéria,
na magia geológica de estratos simplificados,
vazando as rosáceas, o vazio entre as letras. Porque a terra ardia, pelo seu centro doloroso, sobre pálpebras,
orquestras negras.
E eis que chego à imagem exacta do meu rosto,
ao terceiro acto da Valquíria.
A minha vida era redonda, como uma papoila,
rompendo todos os textos.
Tremia de medo.
A relva tinha joelhos tímidos, os meus olhos voavam. Eu era uma chama humedecida exaltando o sangue
e os ritmos ocultos, o corpo, os meteoros,
deslumbrados arco-íris, sonhos petrificados
e a matéria luminosa
Maria do Sameiro Barroso, inédito, in " Idades Sonâmbulas".
26/11/2005
( sensações )
150 anos depois. A Eça de Queirós, com um dia de atraso...
20/11/2005
Vogais e Consoantes no Carnaval das letrinhas*
"O LIVRO-JARDIM fechou-se
Nota de rodapé - Esqueci-me, empolgada que estava na releitura e escrita, de fazer referência às ilustrações de Simona Traina...é que esta menina também sabe brincar ao faz-de-conta, e, soube acompanhar, com crescente ingenuidade, o imaginário de Glória Maria Marreiros.
O SOL, A LUA E O ASTRO MAIOR / Democracia da Leitura
18/11/2005
CASA, PROCURA-SE
Quero mudar-me este Verão -
A alma já me extravasa:
É pequena esta morada
Para tanto coração. Vou visitando os olhares,
Em busca de novo abrigo -
Se comigo te cruzares,
Prende-te aos meus vagares
Nesta via que prossigo. Deixa que na tua pele
Minha alma pouse os lábios -
E que esse beijo tão breve
Pra dentro de ti me leve
E acalme os meus cuidados. Tua alma é arejada,
Cabem lá as minhas dores?
Vou aí fazer pousada,
Se tudo nela me agrada
E paciente tu fores. Minha alma às vezes acorda,
E não tem hora nem dia,
A velha dor sempre nova,
E dentro da dor soçobra -
Queres esta companhia? A de um velho coração
Que anda procurando casa -
Que quer outra habitação,
Com alicerces no chão
E por telhado uma asa? Mas onde esta dor profunda
Possa caber à vontade -
E encontrar em ti ajuda,
Que a dor dilua e cubra
Da ternura que te invade. Queres este velho poeta
Que continua menino
E na alma sempre inquieta
A dor do mundo projecta,
E a outra, do seu destino? Dá-me só a tua mão
Pra que a ternura se acenda -
Teus olhos logo dirão,
Se avanço na instalação -
Depois, discute-se a renda. Posso pagar-te em poemas?
Um por dia chegará? -
Só quero que tu entendas
Que melhores pagas ou prendas
Do que as palavras, não há. Nada mais tenho pra dar-te
Do que esta escrita empenhada -
Com maior ou menor arte,
Contigo tudo reparte
Meu estro em tua morada. Mas se ninguém me quiser,
Se minha alma é excessiva,
Há sempre casa e mulher
Onde o poema estiver -
Onde ele vive, que eu viva. António Simões, inédito, in "Poemas Circulares: Moradias e Navegações".