quando o fruto se abriu em semente
quando a noite rasgou o ventre de minha mãe
trazia
o vagido fechado das primeiras pancadas
os pés abertos no cordão que me cortaram
contei
cada segundo que passava do acto em que nasci
( como se adivinhasse que
correriam sobre os meus olhos
pisariam os meus ossos ou
cuspiriam a minha carne crua )
corri
pendurada nas hastes do tempo
pelos lagos da minha infância
suguei
o tutano viscoso das palavras
o sentido da REVOLTA e
guardei
as minhas ambições nas prateleiras
duma biblioteca quadrada
assisti
à dança macabra das freiras
enfeitadas com colares de espanto
saí
de mim
dos compêndios riscados com borronas
das sebentas bentas pelos lentes e
vomitei de nojo
corri
as ruas duma cidade infecta
desfraldei
bandeiras rubras de sangue
soltei
temporais de vento norte
descobri
o amor mecânico das prostitutas
abri
os olhos no sono dos homossexuais
pisei
as mãos dos mortos
amei
com dedos carregados de ternura
precisei
um mundo de beleza e
senti
no corpo
o gosto acre da derrota
descansei
meus olhos sem lágrimas
devorei
livros, teorias, ensaios, filmes
vivi
as guerras, as bombas de napalm
percorri
caminhos de Mao a Ho-Chi-Min
embosquei
a raiva na morte de Che Guevara
alvorocei
cidades condenadas
ensinei
crianças famintas de cultura e fome
vi
meu corpo caminhar sem medo
minha boca falar por si
minha razão tomar razão
meus pés andarem sem bengalas e
meus braços sem muletas
despi-me
rindo com todos os dentes
no pudor dos precocemente enterrados e
FIZ-ME.
gabriela rocha martins
1 comentário:
Boa, miúda!
Assim é que é.
é!é!é!é!é!
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