25/09/2005

que sabemos nós das dores de cada um?

para o Augusto Mota

Que sabemos nós das dores de cada um?
sabemos dum rio dum pomar duma flor
dum pássaro morto na primavera
e tudo isso escrevemos num poema
- mas das dores de cada um que sabemos nós?
dos homens anónimos que viajam na solidão dos eléctricos
dos meninos que amanhecem mortos
junto aos muros das grandes cidades que sabemos nós?
sabemos acaso como doem as suas lágrimas no silêncio
quando a tarde é uma pedra de melancolia
caindo sobre os ombros?
ah tudo isso escrevemos num poema
mas de tudo isso que sabemos nós?
quando as luzes se acendem na cidade
e a noite é uma lágrima
que sabemos nós do desespero das mãos vazias
dos olhos que não vêem mais que a noite
para além duma janela sem cortinas?
ah tudo isso escrevemos num poema
mas dos que ficam para contar aos que vierem
das suas dores na madrugada
e da esperança que a noite trará um dia às suas mãos vazias
e aos seus olhos que não vêem mais do que a noite
para além duma janela aberta sem cortinas que sabemos nós?
ah tudo isso escrevemos num poema.
Luis Pignatelli, in "Obra Poética - 1953-1993", editora & etc.

7 comentários:

Anónimo disse...

E o Augusto Mota merece-o.
Apesar do dito,o quanto fica por dizer, apesar do muito subentendido.
A solidão de um ser.

Anónimo disse...

Nada é dito que o poeta não queira.
Não é verdade Luís?
A riqueza de um homem está sempre aquém do que sobre o mesmo é dito.
Felizmente nunca binguém conseguiu descrever a essência.
No entanto, na sua ausência, basta-nos saber que um poema a pressupõe.
E há que dizê-lo - Em pleno!

Anónimo disse...

De um Amigo alguém escreveu...
Nada ficou que os deuses não tenham mascarado torturado dilacerado.
Na morte fica-nos o rescaldo belo de uma vida vivida a dois.

Um futuro mitigado a solo

Anónimo disse...

Agradeço, muito reconhecida, ao Augusto Mota, os "Ternos Guerreiros" que fez o favor de me oferecer e que hoje chegaram às minhas mãos.
Ao portador, agradeci pessoalmente.

( Pronto, Gabriela.
Amiga, como vês não me esqueci. )

Colocá-los-ei no escritório, onde diariamente trabalho. É a minha maneira de ter-vos sempre presentes...

Anónimo disse...

É bem verdade o que diz o Poeta.
De facto, o que sabemos nós das dores de cada um?
E, infelizmente, nos dias que correm, repletos de egoísmos e autismos, muito menos.
É tempo de Parar e Reparar...
È urgente!

Anónimo disse...

Nenhum HOMEM pode sofrer a dor de outro . Na verdade, as causas do sofrimento de cada um estão para além de tudo o que possa ser perceptível. E, assim, cada DOR é uma dor !
Fernanda.

Anónimo disse...

Que mais dizer?
O Augusto Mota que o faça, se quiser!
Há muito que detém as chaves deste "palácio"...

...de sobranceiras varandas voltadas, ora, a norte.