Always Astonished, by Edwin Honig
Sei que despertei e que ainda durmo. O meu côrpo antigo, moído de eu viver diz-me que é muito cêdo ainda...
Sinto-me febril de longe. Péso-me, não sei porquê...
N'um torpôr lucido, pesadamente incorpóreo, estagno, entre o somno e a vigilia, n'um sonho que é uma sombra de sonhar. Minha attenção boia entre dois mundos e vê cegamente a profundeza de um mar e a profundeza de um céu; e estas profundezas interpenetram-se, misturam-se, e eu não sei onde estou nem o que sonho.
Um vento de sombras sópra cinzas de propósitos mortos sobre o que eu sou de desperto. Cahe de um firmamento desconhecido um orvalho môrno de tédio. Uma grande angustia inerte manuseia-me a alma por dentro e, incerta, altera-me, como a briza aos perfis dos cópas.
Na alcova mórbida e morna a antemanhã de lá fóra é apenas um halito de penumbra. Sou todo confusão quieta...Para que ha-de um dia raiar?...Custa-me o saber que elle raiará, como se fôsse um esforço meu que houvesse de o fazer aparecer.
Com uma lentidão confusa acalmo. Entorpeço-me. Bóio no ar entre velar e dormir, e uma outra especie de realidade surge, e eu em meio d'ella, não sei de que onde que não é este...
Surge mas não apaga esta, esta da alcôva tépida, essa de uma floresta extranha. Coexistem na minha attenção algemada as duas realidades, como dois fumos que se misturam.
Que nítida de outra e de ella essa trémula paysagem transparente!...
E quem é esta mulher que commigo veste de observada essa floresta alheia? para que é que tenho um momento de m'o perguntar?...Eu nem sei querel-o saber...
A alcôva vaga é um vidro escuro atravez do qual, consciente d'elle, vejo essa paysagem... e essa paysagem conheço-a ha muito, e ha muito que com essa mulher que desconheço érro, outra realidade, atravez da irrealidade d'ella. Sinto em mim séculos de conhecer aquellas arvores e aquellas flôres e aquellas vias em desvios e aquelle sêr meu que alli vagueia, antigo e ostensivo ao meu olhar que o saber que estou n'esta alcova veste de penumbras de vêr...
Sinto-me febril de longe. Péso-me, não sei porquê...
N'um torpôr lucido, pesadamente incorpóreo, estagno, entre o somno e a vigilia, n'um sonho que é uma sombra de sonhar. Minha attenção boia entre dois mundos e vê cegamente a profundeza de um mar e a profundeza de um céu; e estas profundezas interpenetram-se, misturam-se, e eu não sei onde estou nem o que sonho.
Um vento de sombras sópra cinzas de propósitos mortos sobre o que eu sou de desperto. Cahe de um firmamento desconhecido um orvalho môrno de tédio. Uma grande angustia inerte manuseia-me a alma por dentro e, incerta, altera-me, como a briza aos perfis dos cópas.
Na alcova mórbida e morna a antemanhã de lá fóra é apenas um halito de penumbra. Sou todo confusão quieta...Para que ha-de um dia raiar?...Custa-me o saber que elle raiará, como se fôsse um esforço meu que houvesse de o fazer aparecer.
Com uma lentidão confusa acalmo. Entorpeço-me. Bóio no ar entre velar e dormir, e uma outra especie de realidade surge, e eu em meio d'ella, não sei de que onde que não é este...
Surge mas não apaga esta, esta da alcôva tépida, essa de uma floresta extranha. Coexistem na minha attenção algemada as duas realidades, como dois fumos que se misturam.
Que nítida de outra e de ella essa trémula paysagem transparente!...
E quem é esta mulher que commigo veste de observada essa floresta alheia? para que é que tenho um momento de m'o perguntar?...Eu nem sei querel-o saber...
A alcôva vaga é um vidro escuro atravez do qual, consciente d'elle, vejo essa paysagem... e essa paysagem conheço-a ha muito, e ha muito que com essa mulher que desconheço érro, outra realidade, atravez da irrealidade d'ella. Sinto em mim séculos de conhecer aquellas arvores e aquellas flôres e aquellas vias em desvios e aquelle sêr meu que alli vagueia, antigo e ostensivo ao meu olhar que o saber que estou n'esta alcova veste de penumbras de vêr...
De vez em quando pela floresta onde de longe me vejo me vejo e sinto um vento lento varre um fumo, e esse fumo é a visão nítida e escura da alcova em que sou actual, d'estes vagos moveis e reposteiros e do seu torpôr de nocturna. Depois esse vento passa e torna a ser toda só-ella a paysagem d'aquelle outro mundo...
Outras vezes este quarto estreito é apenas uma cinza de bruma.
(...)
Outras vezes este quarto estreito é apenas uma cinza de bruma.
(...)
Fernando Pessoa, Na Floresta do Alheamento
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