22/06/2005

5ª sinfonia de Beethoven

o dia começa e mantém-se cinzento / Faz frio
e o nevoeiro de fim de tarde cai tornando irreais os corpos e os seus contornos
Acabo de arrumar o carro / e
ao desligá-lo / armazeno um saber feito de insapiências
Sento-me frente ao computador / de costas viradas para a janela / Na moldura
frente ao alpendre restam duas casas / A primeira impõe-se pela sua despida ausência / as
paredes decrépitas erguem-se às núvens e a mim
A segunda / nova
grita a sua vontade de ser

... ...
este o cinzento aberto ao imaginário
... ...
O homem pássaro / o novelo agita-se
o braço e a asa deslocam-se do novelo / A música aumenta o
bater da asa / no extremo / a mão quebra
projectada no ar / onde dançam os dedos ou as penas prontas a cair
e a enroscar-se no novelo
Destaca-se a cabeça / o queixo e o bico cortam o ar e
o olhar fixa-se na presa

... ...
recomeça o enrolar e o desenroscar do corpo

... ...
uma perna / uma asa / um braço
exibem frémitos de vida e força
no auge dos compassos heróicos / ( 5ª sinfonia de Beethoven )

Eis-me pronta a desafiá-lo/ como afronta à sua dimensão
exibo o meu corpo nú e danço / solta
no limite do cansaço

gabriela rocha martins, in "Hydra", inédito, 2005




2 comentários:

Anónimo disse...

Um belíssimo "golpe de rins" do imaginário poético

Anónimo disse...

Olá, António...as tuas palavras aquecem mesmo quando o calor aperta ( sobretudo quando sabemos)