09/07/2005

Laranjofilia

Na praça só de hoje
passeia o esqueleto.
Na praça cheia desses atributos que damos às coisas
e as tornam desumanas,
nesta praça enlouquecida e branca
de pó que já foi casas conforto e doença,
passeia o esqueleto a comer uma laranja.
Há quem diga que valeu a pena
ter ido buscar morte e laranjas ao pomar.
Há quem diga que não,
há quem berre e grite alto muito alto
há quem mate mil vezes o esqueleto
há quem peça para ele o inferno de mil deuses
mas a calma dele a comer laranja desnorteia.
António Simões, in "Ainda", 1958, coimbra

11 comentários:

Anónimo disse...

Premonitório este poema de António Simões, escrito em 1958...

Anónimo disse...

Que em 2006 não nos esqueçamos do amargos de boca no eventual regresso de um "esqueleto" laranja.

Anónimo disse...

meus amigos, Filipe e António!
...deixem-me, ao menos, acabar de publicar...
obrigada aos dois.
mil beijos!

Anónimo disse...

Perigo laranja à vista.
Zona de catástrofe iminente

Anónimo disse...

segundo dados científicos, a laranja provoca acidez crónica e afecta o fígado.
aconselha-se outra fruta...

( se se verificarem os sintomas acima mencionados, não digam que não os avisámos...)

Anónimo disse...

António Simões preveniu-nos em 58 e estamos a ser prevenidos agora ! E ele dança e bate o queixo (torto, ainda por cima)o esqueleto laranja, novamente, aparecendo subtilmente (ou talvez não...) em tudo que nos entra em casa!!! E que havemos nós de fazer, Mota, rodeados pelo tentacular laranjal nacional por todos os lados ?? Resistir e denunciar "...mas a calma dele a comer laranjas desnorteia"...
Bom fim de semana sem o amargo da laranja.
Fernanda.

Anónimo disse...

Queridos Amigos: Emociona-me muito reler este e outros poemas do AINDA (1958). Eu tinha então 23 anos e a Pide rosnava no laranjal do medo. Mas nós sabíamos que mesmo que reduzissem o homem à forma de esqueleto, não poderiam imepedi-lo de ir colher o fruto então proíbido, a doce Liberdade, aqui metaforicamente viva nessa laranja que o poeta, que transportava dentro de si todos os que viviam privados de Liberdade, ia colher. E os guardiões do templo ficavam descontrolados, perdiam a compostura, o norte, furiosos com a calma, que significava a tranquila certeza de um dia surgir a liberdade triunfante, desse esqueleto obstinado em lutar contra a tirania.
Nós, os que fizemos o AINDA, andávamos então na casa dos 20 anos. Eu fiz 70 em Novembro. O Augusto Mota anda por lá perto. Todavia, continuamos com o entusiasmo, a inquebrantável energia dos 20 anos. Este extraordinário blogue que a Maria Gabriela Rocha Martins pôs de pé, deu uma surpreendente, inesperada oportunidade de trocarmos os nossos sonhos com os vossos, trazê-los do passado distante ou recente, dar-lhes a intemporalidade da partilha. Façamos deste local de verdade e beleza, a sala comum onde nos encontremos sempre que quisermos. Todos nós somos construtores do mundo. Cada poema, texto, imagem, comentário é um tijolo para que essa construção cresça ao serviço da Paz e da Felicidade de todos.
Um grande abraço do
António Simões

Anónimo disse...

agora, Amigo António Simões, sou eu que fico, particularmente, sensibilizada e comovida.
sinto-me qual formiguinha que teme, face à enorme responsabilidade da POESIA e da BELEZA, perder-me. tenho-vos, porém, por perto.

todavia, há um ajuste a fazer. este blogue é fruto da cumplicidade de dois amigos...só assim surgiu.
um lançou o repto. o outro aceitou-o.
ambos, por ele, são responsáveis - o Augusto Mota e a Gabriela Rocha Martins - e com todos os demais sonhadores iremos em demanda da Utopia...obrigada, meu Amigo, visionário da Liberdade!

Anónimo disse...

querida Fernanda!
para si, um especial - e nada amargo - beijinho.
hoje, como sempre, aliás, merece. será inteiramente sua... a surpresa do Augusto...

Anónimo disse...

Olá ... Surpresa....minha ???

Anónimo disse...

pode ficar para amanhã, minha Amiga?
O tempo fez-me a partida!
prometo que cumprirei...( e não estou a fazer figas, ah!ah!ah! )