Colocam-se as mãos à volta da rosa,
sem lhe tocar,
para lhe roubar a forma,
das pétalas ao pé. II
Toca-se na rosa com a boca,
até nossos lábios serem pétalas. III
Aspira-se-lhe o perfume intensamente,
até substituir o sangue
em nossas veias por inteiro. IV
Fecham-se os olhos,
e, como num sonho,
levamos a rosa para dentro
do nosso coração. V
Embrulha-se a rosa no nosso olhar,
atada com os fios do vento.
VI
Atrai-se a rosa a um encontro,
num lugar secreto da nossa alma,
e não se deixa mais sair de lá. VII
Olha-se a rosa fixamente,
e com o fio de aço do nosso olhar,
corta-se-lhe o pé. VIII
Tira-se todo o jardim à volta da rosa,
para que ela venha até nós,
ferida de solidão. IX
Captura-se-lhe a chama
quando a sua cor se confunde
com o poente ou o raiar da manhã. X
Deixa-se que o crepitar da rosa
entre em nossa alma,
misturado com o sussurrar de uma seara. XI
Faz-se-lhe uma embuscada
quando o vento da tarde
transporta o seu perfume
dum lado para o outro. XII
Esperamos pacientemente
que se dilua no orvalho que a cobre toda,
e bebemo-la depois,
gota a gota. XIII
Deixamos a rosa, livre, intacta,
para a podermos colher,
com a avidez dos nossos sentidos. António Simões, inédito.
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* O título é uma glosa do poema de Wallace Stevens "Treze Maneiras de Olhar um Melro".
5 comentários:
Antes de recolher para jantar a leitura obrigatória de um dos blogs que, habitualmente, visito, sempre com agradáveis surpresas para os nossos ( já um pouco )cansados olhos.
Um abraço.
A diferençaexistente entre a beleza deste poemae aquele que lhe serviu de base.
Sei que os poemas e poetas não devem ser "medidos", mas não há a mais pequena dúvida de que, enquanto é uma doçura ler um poema - seja ele qual for - de António Simões, escrito em português, e, uma tradução do maior génio poético, não há comparação possível.
De qualquer modo, para mim, é sempre com inegostável prazer que leio o poeta António Simões.
Peço licença para aqui descansar um pouco à beira deste poema salpicado de pétalas de rosas.
Há botões de rosas deitados sobre os versos do poema.
São os dedos do poeta.
De leitura obrigatória.
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